Na noite de 11 de abril, o Tokio Marine Hall, em São Paulo, foi palco de uma apresentação histórica do Uriah Heep. A turnê The Magician’s Farewell chegou à capital paulista com ares de despedida, mas, ao contrário do que o título sugere, a banda deixou claro: não se trata de um adeus definitivo. A promessa é apenas desacelerar, não desaparecer. E, se a apresentação for indicativa do que ainda está por vir, o legado do grupo segue firme e relevante. A abertura ficou por conta dos paulistanos da banda Allen Key.

Com o público ainda chegando, a Allen Key, liderada pela vocalista Karine Menascé, apresentou o melhor do seu hard rock contemporâneo. Músicas como “Granted”, “Straw House”, “Sleepless”, “Easy Prey” e “Get In Line” compuseram o repertório. O estilo da banda, mais moderno, destoou do hard rock setentista do Uriah Heep, resultando em uma recepção morna por parte do público — majoritariamente acima dos 45 anos e, em sua maioria, pouco familiarizado com o grupo de abertura. Ainda assim, a Allen Key demonstrou profissionalismo e fez uma apresentação consistente e segura.

O momento mais aguardado: Uriah Heep

O momento mais aguardado da noite chegou com a entrada do Uriah Heep. A atual formação demonstrou por que a banda ainda se mantém relevante nos palcos internacionais. Bernie Shaw (vocais) continua carismático e seguro; Mick Box, guitarrista e único integrante original, exala simpatia e domínio absoluto do instrumento. Phil Lanzon (teclados), Dave Rimmer (baixo) e Russell Gilbrook (bateria) completam o grupo com precisão e energia, formando uma base sólida para o som da banda.

O Uriah Heep começou a noite com “Grazed by Heaven”, uma faixa que imediatamente capturou a atenção do público. A combinação de riffs poderosos e a voz de Bernie Shaw criou uma atmosfera eletrizante. Os fãs, muitos dos quais acompanham a banda há décadas, cantaram junto a cada palavra, mostrando a conexão profunda que têm com a música do Uriah Heep. Na sequência, “Save Me Tonight”, do disco mais recente, Chaos & Colour (2023), provou que os britânicos conseguiram manter a essência que os consagrou em um hard rock primoroso.  

“Overload” manteve a pressão, com riffs pesados e uma bateria marcante. A banda entregou uma versão potente, com destaque para os vocais afiados de Bernie Shaw e os solos de guitarra de Mick Box, sempre carismático com seu eterno sorriso e seus gestos teatrais. Clássicos também tiveram espaço de destaque. “Shadows of Grief” mergulhou os presentes no lado mais progressivo do grupo, com suas mudanças de andamento e clima denso. O destaque ficou para os teclados de Phil Lanzon, que criavam atmosferas e desafiavam as guitarras de Mick Box, proporcionando uma verdadeira viagem aos anos 1970.

“Stealin’”, um dos maiores sucessos da banda, teve uma recepção calorosa. Não era para menos: um dos hinos da banda fez a plateia cantar cada verso com devoção, transformando o Tokio Marine Hall em um verdadeiro coral. “Hurricane”, mais uma do álbum mais recente, trouxe um sopro de energia renovada, com Mick Box entregando riffs potentes que incendiaram o público. Um dos momentos mais marcantes da noite foi a transição para “The Wizard”, com Mick no violão. Certamente, um momento de pura magia, no qual os fãs reverenciavam a beleza da canção e a habilidade incontestável do guitarrista.

A sequência com “Sweet Lorraine” e “Free ‘n’ Easy” manteve o ritmo intenso, com um pequeno solo de bateria no final desta última que arrancou muitos aplausos. A energia e a paixão com que eles tocaram mostraram que ainda têm muito a oferecer aos fãs. Antes de seguir com a épica “The Magician’s Birthday”, Bernie Shaw reforçou que, apesar do nome da turnê, a banda não iria parar, mas sim diminuir o ritmo. Para os fãs de longa data, foi um grande alívio esse anúncio. A surpresa foi a longa jam durante a faixa, na qual Mick e Gilbrook, como dois feiticeiros, protagonizaram uma verdadeira viagem instrumental, encantando o público com um improviso eletrizante.

Na reta final, a banda emendou uma sequência matadora: “Gypsy” e “July Morning” incendiaram o palco com interpretações viscerais e envolventes. Era claro que ninguém queria que a noite acabasse. A volta para o bis, “Sunrise”, trouxe uma atmosfera quase mística, preparando o terreno para o desfecho perfeito: “Easy Livin’”, que pôs todos para cantar, pular e aplaudir. Uma despedida? Talvez do ritmo intenso de turnês. Mas a chama do Uriah Heep ainda arde — e São Paulo foi testemunha disso. Embora a turnê carregue o nome de uma despedida, o que se viu foi uma celebração vigorosa de um legado que ainda promete novos capítulos.

Confira as fotos de Jéssica Marinho:

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Paulistano e apaixonado por rock desde os 10 anos, comecei a descobrir o universo da música pesada quando um amigo gravou uma fita K7 com Viper, Judas Priest, Metallica, entre outros. Na sequência, conheci o Black Sabbath e foi um caminho sem volta ... Frequentador assíduo de shows, já acompanhei centenas de apresentações das principais bandas de rock/metal e suas diversas vertentes. Nos últimos anos, tenho transformado minha paixão pela música em palavras, compartilhando resenhas sobre shows e permitindo que os leitores vivenciem a emoção de cada apresentação.