Texto por Diogo Tomaz
Estamos passando por um momento muito complicado da educação brasileira, não que tenhamos essa exclusividade no mundo, mas, com todas as dificuldades já existentes, o ensino à distância imposto pela pandemia de Covid-19 tem potencializado inúmeras dificuldades, tanto dos professores quanto dos alunos. Se em tempos normais de aulas presenciais já é algo difícil você conseguir a atenção de um aluno durante 50 minutos, imagina agora você tendo a concorrência das redes sociais, do seu – agora mais do que nunca – inseparável celular, de sua cama quentinha, dos jogos online…
Não é de hoje que venho buscando novas formas e ideias para transformar minhas aulas de História em aulas mais prazerosas. Utilizo games que abordam temáticas históricas, filmes e séries, vídeos do Youtube, Histórias em Quadrinhos… e Música! O estudo das sociedades do passado e de seus acontecimentos não funcionam como uma chave que abre um baú recheado de respostas para todas as nossas indagações. O nosso dia a dia está impregnado de História, e por isso, levo para minhas turmas acontecimentos de seu cotidiano.
Como fã do Iron Maiden desde os meus 8 anos de idade é óbvio que não deixaria de utilizar suas letras que abordam diversas temáticas históricas. Utilizei as músicas “Hallowed be thy Name” e “Montségur” para explicar aos meus alunos de 1º ano do Ensino Médio como a Inquisição Católica perseguia, prendia, julgava e sentenciava os cátaros. Para explicar como chegamos ao lançamento das bombas atômicas em Hiroshima e Nagasaki, usei com minha turma de 9º ano a música “Brighter Than” a “Thousand Suns”, onde aproveitei para explicar sobre o Projeto Manhattan. Essas aulas “diferentes” – como muitos alunos as batizaram – são pedidas e aguardadas por todas as turmas que leciono. Por isso, nesse texto, comento como analisei historicamente a música “The Longest Day” com uma turma de 3º ano do Ensino Médio.
A LETRA
Dentre os diversos assuntos históricos abordados em suas letras, os assuntos militares são muito comuns, principalmente após o álbum A Matter of Life and Death, que até na capa aborda uma temática belicosa. Batalhas históricas e atos de heroísmo durante a Segunda Guerra Mundial podem ser explicadas pelo fato do vocalista Bruce Dickinson ser formado em História e ser um grande entusiasta da aviação (Bruce é piloto comercial habilitado há mais de 20 anos, é Capitão Honorário da Força Aérea Britânica (RAF) e costuma pilotar o Ed Force One, o avião que transporta a banda pelas turnês mundiais. Além disso, Bruce é radialista, escritor, empresário, palestrante, apresentador de rádio, esgrimista, mestre cervejeiro e, ao lado do baixista Steve Harris, o principal letrista da banda).
“The Longest Day”, a quinta faixa do álbum A Matter of Life na Death, de 2006, aborda em sua letra o desembarque das forças aliadas na Normandia durante o Dia D, na Segunda Guerra Mundial. Representando o primeiro passo de uma campanha oficialmente batizada de Operação Overlord em 6 de junho de 1944, a música retrata de forma bem vivida a aproximação e o desembarque dos anfíbios à praia e o confronto que se segue.
Todos almejam a ferramenta para construir a máquina
Para tornarem homens de carne e sangue em aço
Soldados de papel em corpos sob a orlas
areias de verão no Apocalipse
Overlord é seu mestre, não o seu Deus
A orla inimiga amanhece cinza e enevoada
Estas infelizes almas vomitam, se tremem de medo
Para ser baleado por aqueles que os enviaram aqui
O mundo está bem as falésias irromperam em chamas
Não há escapatória, granadas chovem sem remorso
Homens se afogam, sem chance para um destino de guerreiro
Uma morte sufocante, adentre os portões do inferno
Nunca, na história, houve uma operação militar tão complexa e grandiosa como o Dia D: 10 mil aviões, 6 mil navios, 160 mil soldados e centenas de veículos foram mobilizados. Os alemães não acreditavam que os aliados atacariam por céu e mar debaixo de nuvens negras que prenunciavam uma tempestade. No entanto, a Operação Overlord foi colocada em prática durante aquela madrugada, mudando os rumos do conflito.
Nas trevas, a tempestade que se forma diminui de intensidade
Nos barcos olhos perfurantes aguardam
Um chamado às armas para derrubar todos os portões
Para explodi-los e jogar o mal a seu próprio destino
O clima foi um fator crucial para o desembarque e, embora em maio tivesse feito um clima agradável, junho não seguia da mesma forma. A escolha da data, não foi apenas correta, foi milagrosa. Um dia antes o tempo estava terrível, com ventos e chuva forte sobre o litoral francês. O capitão J. M. Stagg apostava em uma “trégua” no mau tempo. E conseguiu. Se os aliados não tivessem cruzado o Canal da Mancha no dia 6, seus planos teriam de ser adiados em duas semanas para conseguirem outra brecha no tempo, e mesmo assim, poderia coincidir com a pior tempestade que o canal vira em 40 anos.
Escorregando nós seguimos, apenas medo há ao nosso lado
Até o limiar dos cabos
E nós nos atiramos junto a maré
Oh, a água se torna vermelha
Com o sangue dos mortos
Mas ainda estou vivo, rezo a Deus para sobreviver
Quanto tempo neste mais longo dia
Até que finalmente sobrevivamos à isto
Quanto tempo neste mais longo dia
Até que finalmente sobrevivamos à isto
Os mortos aumentam, com seus rostos inchados
Eles já foram consolados, os vivos esperam por sua vez
O seu número foi escolhido, a bala tem o seu nome escrito nela
Você ainda segue adiante, indo e voltando do inferno
No fim do dia 6, 133 mil soldados aliados tinham desembarcado e outros 23 mil chegaram de paraquedas. A campanha durou quase 90 dias e custou a morte de 445 mil pessoas (entre soldados e civis) até a chegada dos aliados a Paris, em agosto. A derrota na França acuou os exércitos de Hitler e encaminhou o fim da guerra. Hoje existem 27 cemitérios de guerra na região da Normandia, com cerca de 110 mil mortos enterrados (não só do Dia D). O total de heróis conta com 77.866 alemães, 9.386 norte-americanos, 17.769 britânicos, 5.002 canadenses e 650 soldados poloneses.
Vale mencionar que o título da música é inspirado em um filme homônimo de 1962 (que se inspirou no best-seller de Cornelius Ryan de 1959, também batizado de The Longest Day). O filme possui quase três horas de duração e foi uma tentativa grandiosa de mostrar o desembarque na Normandia pelo ponto de vista dos soldados. A produção não apenas captura a operação militar, como também conta com um elenco estrelado de Hollywood, como Henry Fonda, Richard Burton, Robert Mitchum e John Wayne. O que busquei apresentar aqui são trechos da música que são possíveis de serem trabalhadas com os alunos, tentando trazer para a sala de aula uma ferramenta – a música – que, normalmente é ligada à diversão. A elaboração desse texto nos permite perceber o enorme potencial que a utilização de canções pode ter enquanto documento histórico e como proposta didática. Foi uma forma alternativa de diversificar as práticas pedagógicas no ambiente escolar das turmas do 3º ano do Ensino Médio.
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