Nita Strauss sabia que aceitar o convite para participar da banda de Demi Lovato seria, no mínimo, “polarizante”. Nos últimos oito anos, a guitarrista de técnica e presença arrebatadoras fez turnês ao redor do mundo com Alice Cooper, construindo paralelamente uma carreira solo amplamente apoiada pelos fãs, e agora embarca em uma nova fase da carreira, aceitando o desafio de levar o rock para uma possível nova geração de fãs.

“É uma oportunidade maravilhosa, estou adorando, sabe? Mostrar a essa nova geração de fãs o que fazemos e a música que amamos, com as guitarras pesadas e as baterias enérgicas. E Demi é uma vocalista poderosíssima, então é uma boa banda de rock”, contou ao Wikimetal na última quarta-feira, 30, logo após iniciar a turnê do álbum Holy Fuck em São Paulo.

Quando o motivo para a saída da artista da banda de Cooper foi revelado, muitos apoiaram a decisão de Nita – inclusive Alice Cooper, que não fechou as portas da banda para um eventual retorno. “Eu estou feliz, os fãs da Demi estão felizes, as pessoas da minha vida estão felizes, Alice e a banda, nós estamos felizes. Então eu acho que o mais importante é estar confiante e feliz com suas próprias escolhas”, explicou a guitarrista. 

Ainda assim, era de se esperar que uma parte do público torcesse o nariz para a mudança tão drástica: apesar da guinada brusca em direção ao rock no novo álbum, Demi Lovato ainda é conhecida como uma diva da música pop e fruto da Disney. E se fãs de música pesada conseguem se irritar com o sucesso viral do Metallica, quem dirá com o flerte do mainstream com rock e metal. 

“Muitas pessoas têm dificuldade em aceitar essa mudança. E tudo bem também. Cada um tem direito à sua opinião. Acho que a única vez que isso realmente ultrapassa um limite é quando você é rude, se está xingando e sendo intolerante. Isso nunca é aceitável, mas também é apenas parte da vida. Existem guerreiros de teclado na internet agora, falam o que querem com seguraça”, pontuou.

Ainda assim, a expectativa de Nita é que muitos fãs de rock e metal mudem de ideia quando assistirem ao show construído ao lado de Demi Lovato, que recrutou uma banda extremamente habilidosa e completamente feminina para acompanhá-la por uma extensa turnê mundial, apresentando músicas antigas do catálogo com arranjos completamente novos e pesados. “Sabe, eu me sinto meio que amada [com essa reação das pessoas]. Estou animada para que saiam mais vídeos da turnê e as pessoas entendam que é uma coisa legal acontecendo. Você pode não ter entendido a princípio, mas é algo muito interessante”.

E realmente, só é possível entender o ponto de Nita Strauss assistindo ao novo show de Demi Lovato. Os fãs fiéis da cantora rapidamente aprenderam a saudar os solos da guitarrista com as mãos em chifre e alguns até arriscam bater a cabeça. Acima de tudo, a plateia de São Paulo no Espaço Unimed, na última quinta, 31, embarcou completamente na nova sonoridade dos hits de Lovato, que cumpriu bem a missão de fazer um show potente de rock ao vivo, com som sujo, bateria e baixo presentes e solos de guitarra que, apesar de mais curtos do que gostaríamos, ainda são de arrepiar. 

Para além da música, existe ainda mais um fator que conecta Nita Strauss e Demi Lovato: a luta contra o vício. Enquanto a guitarrista está sóbria há sete anos e fala abertamente sobre isso, a história de Lovato com o vício é amplamente noticiada e já quase tirou a vida da artista mais de uma vez. 

“E até para mim, uma artista em recuperação, escutar a história da Demi, antes mesmo de conhecê-la, eu fiquei inspirada. E ela é uma compositora que fala tudo, é crua e honesta. Nesse novo álbum, ela leva os fãs em uma jornada e diz: Não sou perfeita, estou com dificuldades, estou aqui com vocês, estou lutando”, contou a guitarrista, que se identifica especialmente com a música “Happy Ending”, na qual Demi confessa que sente falta dos vícios, mesmo estando sóbria, e isso ajuda as pessoas que também sofrem com a falta do álcool ou das drogas, mas que decidiram seguir no caminho da recuperação. 

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O retorno da guitarrista aos palcos depois da pandemia tem sido intenso. Apenas em 2022, Strauss já esteve diante de plateias de diferentes magnitudes, em festivais com Cooper e em casas pequenas com a banda solo. “Minha parte favorita de estar em turnês, especialmente agora, é ver os fãs novamente. Porque temos esse senso de gratidão compartilhado”, observou. “Ninguém vai deixar de valorizar isso novamente”. 

Prestes a subir ao palco do Rock In Rio mais uma vez, desta vez ao lado da cantora pop que é, na verdade, uma headbanger no coração, Nita Strauss demonstra emoção ao falar da experiência de subir no palco do festival. “Eu não sei se os brasileiros realmente entendem o que vir para o Rock In Rio significa para artistas americanos. É tão especial e você cresce ouvindo sobre o festival e não temos a chance de vir ao evento nem como fãs, muito menos se apresentar”, disse. “E o Rock In Rio 2017 [com Alice Cooper] foi um dos melhores momentos da minha vida. Quando me perguntam meus shows favoritos, esse sempre está na lista. Me sinto sortuda e animada por ter a chance de me apresentar lá mais uma vez”. 

Mesmo com uma agenda lotada pelos compromissos com Demi Lovato, a carreira solo da guitarrista não vai ficar em segundo plano. Depois do sucesso do single “Dead Inside”, com a participação de David Draiman, do Disturbed, que a tornou a primeira mulher solo a entrar no Top 10 da lista Mainstream Rock, da Billboard, a cantora lançou recentemente a faixa “Summer Storm”, de volta ao som instrumental. 

Segundo Nita, o sucessor de Controlled Chaos (2018) está na reta final para ser finalizado e terá uma tracklist dividida igualmente entre músicas instrumentais e faixas com cantores convidados. “Achei importante enquanto artista ainda fazer ambas as coisas”, explicou.

Ainda há mistérios sobre a lista de convidados, mas o próximo single terá vocais e um clipe já foi gravado para que a música seja lançada “o quanto antes”. Apesar de não revelar novos nomes confirmados no disco, ela garante que conseguiu “uma boa mistura de novos artistas e artistas com legado” para o projeto. “Você terá vozes novas e algumas que escutou por muitos anos. Terá homens incríveis e também mulheres vocalistas incríveis”, disse simplesmente.

Para o futuro enquanto artista solo, Nita Strauss tem um sonho: “Eu adoraria voltar para o Brasil com minha banda. Eu amo me apresentar aqui, sempre me divirto muito, e minha banda solo apenas fez turnês nos Estados Unidos. Então eu adoraria vir para a América do Sul, ir para Europa, Ásia, Austrália e países diferentes. E espero inspirar jovens meninas a pegarem as guitarras e tocarem, precisamos da próxima geração carregando a tocha”.

E nessa jornada, a decisão de aceitar a oportunidade de levar o rock para outros públicos se mostra cada vez mais acertada e um gesto de amor à música pesada que nenhum headbanger purista poderia entender, fechados na bolha como estão. 

Tendo visto pessoalmente as transformações do rock e metal nos últimos anos, caminhando para se tornar um ambiente de mais representatividade e inclusão, Strauss tem uma certeza: passou da hora do mainstream abraçar o rock e o metal. “Por muitos anos, a gente dizia que o rock é ignorado no mainstream, que não haviam guitarras de verdade, não havia baixo nem baterias. E agora existem artistas como Demi e Machine Gun Kelly trazendo elementos do heavy metal para os shows e para a música, entende? Solos de guitarra, baterias altas, riffs e instrumentos de verdade, e isso é empolgante. É um momento empolgante na música”, concluiu.

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