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Kichi

Kichi. Crédito: Ivan Shupikov

Kichi: uma homenagem a um grande amigo

Kichi faleceu no último sábado, 10

Meu amigo Kichi nos deixou nesse sábado 10 de abril de 2021, aos 50 anos. Foi uma notícia extremamente chocante e muitíssimo triste, primeiro pela idade prematura dele, pela forma repentina que ele simplesmente deixou de viver, pela surpresa; mas principalmente porque Marcos Kichimoto era um dos caras mais legais que eu já conheci, sem exagero.

Eu conhecia o Kichi há tantos anos que eu nem me lembro do primeiro dia que eu o vi, deve ter sido por volta de 1986 quando tinha aula de baixo com o André Pomba e frequentava os ensaios do Vodu, ou em 1987 quando frequentava o Rainbow Bar no Jabaquara e os shows no Teatro Mambembe. Nossas bandas tocavam com frequência nesse circuito, eu com o Exhort e ele com o Desaster. A gente apoiava um ao outro, e sempre acabava trocando ideia, seja no local dos shows ou nas noites em que ficávamos do lado de fora, só batendo papo, sem grana pro ingresso. Nessa época existia uma cena metal em São Paulo, e nós fazíamos parte dela. Eu estava na noite que ele foi atacado por um ônibus lotado de skinheads na porta do Rainbow Bar, eu já tinha ido embora e ele esperava dar 5 da manhã pro metrô abrir. Ele escapou da morte nesse dia, a data estava estampada no braço dele em uma tatuagem. 

O Kichi acabou entrando para a turma das Perdizes, bairro vizinho ao nosso. Ele começou a andar com o pessoal da banda Tormenta, o Guilherme (Sapotone), o Zé Amendola, o Marcelo, o Daniel, o Alê, entre tantos outos. De vez em quando a gente se encontrava nos ensaios do Tomenta na casa do Zé no Pacaembú, era divertidíssimo, e ele sempre estava lá; e também com o pessoal do Objetivo da Paulista, a gente ia em todos os shows de Metal, todos mesmo. Depois ele formou o Kangaroos in Tilt com o Zé, a trabalhar como roadie de bateria do Sepultura, além de estar sempre com o pessoal do Ratos de Porão, com o Gordo e com o Pedrão, em todas as baladas. No início dos anos 90 a gente se encontrava um dia sim e outro também, no New York bar, e depois no São Paulo bar. Sem exagero, estávamos lá todos os dias, ou no Der Tempel, no Retrô, ou depois de algum show no Olympia. Mais pra frente era no Jungle, na Torre do Doutor Zero, ou principalmente no Matrix, ele sempre estava lá. Em todas as festas que eu ia, em todos os shows que eu ia, o Kichi estava lá, sempre alegre, sempre simpático, sempre divertido, sempre trocando excelentes ideias. 

Vou lembrar dele sempre com essa alegria exatamente por isso, sempre que eu o encontrava ele estava feliz, em algum lugar legal, com amigos queridos, se divertindo, contando ou lembrando de alguma história, e foram muitas, muitas mesmo, também foram muitos porres juntos, (muitos mesmo). 

Anos depois ele abriu o Cão Véio, e sempre que podia eu ia visitá-lo, às vezes ia almoçar lá com a família, às vezes levava algum amigo gringo que estava de passagem no Brasil para conhecer o bar. Lá tinha tudo que era bom, som excelente, cerveja excelente, comida excelente e um grande anfitrião, o Kichi (que por sinal, sempre botava umas cervejas a mais: “Experimenta essa”, ele dizia).

Esse era o Kichi, meu amigo querido de tantos anos. 

Mas o que também me impressionou nesse dia 10 de abril, foi que todo mundo se sentiu como eu, todo mundo gostava dele, sem exceção. O cara era uma unanimidade. Gente de todas as turmas. Ele era o cara que aglutinava todas essas turmas, ele era amigo de todo mundo, e todo mundo adorava ele, fosse o pessoal do Metal, do Hardcore, as modeletes, o pessoal do skate, das baladas, do rap, do grafite, da tatuagem. Kichi transitava entre todas as turmas, com passe livre e credencial “All Access”. Se pudéssemos ter tido um velório pra ele, teriam que alugar o Allianz Parque, e ele ia ter ficado muito feliz, era Palmeirense roxo. Era um cara carismático e engraçadíssimo, colocava apelido em todo mundo. Quando me via ele falava: INFERNANDO, EXHORT, GENOCIDE (uma de nossas músicas), ou PICNIC METAL. Ele sempre foi um incentivador, não só meu, mas de todo mundo. Depois da trágica notícia desse sábado eu fui olhar as últimas mensagens que trocamos e ouvi áudios hilários, mensagens muito engraçadas, impublicáveis. 

Ele sempre estava feliz, mas ultimamente eu tinha notado que ele andava meio chateado, com a pandemia e com a questão de ter que fechar o bar. Realmente não acredito que fosse por questões financeiras, mas por não poder trabalhar e assim não poder encontrar os amigos. Isso devia ser muito dolorido, e com certeza, isso não fez bem pra ele.

Na noite desse sábado tive um sonho. Eu sonhei com o Kichi, que estávamos na passagem de som de um show e que a banda dele ia tocar. No sonho ele dizia que a banda dele tinha que ser a primeira a tocar, que tinha que tocar logo porque ele tinha que ir embora mais cedo. Aí eu acordei, triste e chorando. Realmente ele foi embora mais cedo, muito cedo, cedo demais.

Meu amigo Kichi, espero que sua passagem tenha sido tranquila, sem dor, e espero te encontrar de novo um dia, pra falarmos de música, de histórias engraçadas e dar risada, espero você me chamar de Infernando, e eu te chamar de Xikito. Vou lembrar de você sempre que tomar uma cerveja, eu e uma multidão de amigos que você deixou. Obrigado pelas risadas, pelas cervejas a mais, pela camaradagem de tantos anos, pelo respeito e carinho que você sempre teve comigo, e com todas as pessoas que cruzaram seu caminho, você foi gigante! 

Crédito: Daniel Cacciatore
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