Megadeth está em plena efervescência no novo álbum The Sick, The Dying… and the Dead!, 16º lançamento de estúdio. Com um novo baterista e um convidado no baixo, a banda entrega um disco rápido e feroz no sucessor de Dystopia (2016), ganhador do Grammy com a faixa-título na categoria Melhor Performance de Metal. Em entrevista ao Wikimetal, o guitarrista brasileiro Kiko Loureiro falou sobre o novo projeto.
A criação do novo álbum passou por uma “longa jornada” com obstáculos graves. Pouco tempo após a banda começar a se reunir para estudar ideias de músicas, Dave Mustaine foi diagnosticado com câncer de garganta e precisou cancelar alguns shows, inclusive a performance como headliner que o Megadeth faria no Rock In Rio 2019.
Houve um período de pausa no processo de composição, por cerca de seis meses, mas o frontman estava determinado a seguir em frente. O restante da banda fez alguns ajustes e se hospedou perto da casa de Mustaine, que montou um estúdio na residência e deu prosseguimento aos planos, mesmo em meio ao tratamento com quimioterapia.
“Foi diferente, meio tenso… Não no relacionamento [da banda], mas assim tinha essa essa coisa do do tratamento do câncer, você não sabe se o Dave está bem, se está mal, mas ao mesmo tempo, o cara está lá, pronto pra trabalhar. Se fosse outra pessoa, acho que não faria isso, né?”, observou Kiko. “Sempre tem aquela coisa, “Será que ele vai conseguir cantar, como é que vai ser?’, tem esses medos. Mas ele voltou melhor do que antes”.
Com as músicas escritas, o Megadeth voltou aos palcos com Mustaine recuperado antes de partir para a gravação de fato, mas então a pandemia aconteceu e adiou os planos mais uma vez. “Os caras não estavam com essa segurança que ia dar certo gravar um álbum inteiro remotamente, né? Teve esse processo dessas dúvidas todas, do câncer, da pandemia, de estar longe, esse é o lado negativo”, contou o guitarrista.
E quando as gravações estavam na reta final, a banda ainda precisou lidar com o escândalo sexual com uma jovem protagonizado pelo baixista David Ellefson, que acabou demitido e teve todas as contribuições no disco substituídas pelo baixo de Steve Di Giorgio, do Testament.
Essa sucessão de pedras no caminho poderiam ter desacelerado o resultado final do Megadeth, mas The Sick, The Dying… and the Dead! mantém alto nível e potência surpreendentes, talvez pelo lado positivo citado por Kiko Loureiro: a banda teve mais tempo de refinar os resultados com o “distanciamento da música”. “Você volta pra ela com outros ouvidos. E o resultado a gente está vendo, super positivo”, continuou o guitarrista.
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Quando bandas gigantes e com décadas de estrada seguem fazendo álbuns de alto nível ao invés de viver catálogo, o público sempre se surpreende. Aos 50 anos e parte de uma banda com quase quatro décadas de existência, Kiko Loureiro já recebe muitas perguntas sobre o pique do Megadeth, que trouxe um disco técnico e sem sinais de desaceleração em The Sick, The Dying… and the Dead!.
“Esse é um comentário que aparece bastante, de várias formas. ‘Ah, como vocês tem energia pra tocar e fazer turnê?’ Porque é uma mensagem que se passa, (…) acho que a galeria de 20 anos olha e pensa ‘Será que quando eu estiver com cinquenta eu vou ainda conseguir fazer? Quando eu vejo Mick Jagger ou Paul McCartney, também penso, ‘pô, então dá pra tocar fazer show até os oitenta?’”, analisou. “Tenho um sentido muito comentário em cima disso porque tem umas músicas bem difíceis de tocar, bem rápidas. E a tendência das bandas quando o cara vai ficando mais velho é o cara ficar tranquilo, viver de catálogo e, se fizer coisa nova, vai fazendo coisa mais fácil. Na realidade, essas músicas novas do Megadeth são mais difíceis do que qualquer música que você escolher. E se não for mais difícil, é no mesmo nível [de antes]”.
Outra prova do interesse em seguir superando o que já foi feito pelo Megadeth e outros gigantes do metal, o novo álbum também se expande para o universo visual com uma série de clipes que revelam a história da origem de Vic Rattlehead, o mascote da banda, em uma jornada sangrenta com perda, dor e vingança filmada no Brasil.
Com a assinatura de Leo Liberti e Rafael Pensado, os quatro clipes já lançados da série tiveram todas as cenas da jornada de Rattlehead gravadas em nosso país, apenas com as imagens da banda feitas nos Estados Unidos. “Sempre é bom a gente lembrar que foi feito com talento brasileiro”, enfatizou o guitarrista.
Dando eco ao desejo de Dave Mustaine de se provar capaz no presente, ao invés de ser homenageado pelo passado, como o frontman contou recentemente ao falar sobre o Grammy da banda, Kiko Loureiro reforça que não há crítico maior do próprio trabalho do que ele próprio – e ainda “mais que os haters”.
Na mesma entrevista, Mustaine expressou a vontade de passar os conhecimentos de ícone do metal adiante em uma mentoria, algo que o guitarrista brasileiro já pratica em turmas seletas de músicos que desejam dar o próximo passo na carreira. “O que o Dave está falando é no sentido de você estar em turnê com uma banda de abertura e às vezes a gente [dá uns toques], alguma banda menor que já como banda de abertura, então o cara já está no esquema de gravadora, empresário, já tem algum contato. E você pode dar uns toques de poucas coisas que você pode falar que pode mudar o pensamento da banda para que continue crescendo”, contou.
Atualmente em turnê pelos Estados Unidos, a banda já incorporou “Soldier On” e “We’ll Be Back” ao setlist e ainda testará outras faixas na estrada. “A gente tem uma sensação boa de mostrar as músicas novas, mas a gente sabe que estamos mostrando uma música nova. Você está concorrendo, se é que podemos usar essa palavra, com os maiores hits da banda, né? Com qualquer banda é assim, [os fãs dizem] ‘Legal, disco novo? Legal, mas toca aquela lá que eu mais gosto, a ‘Symphony of Destruction’, por favor’. Mas você vai trabalhar aquela música pra que ela se torne uma música importante dentro do catálogo da banda”, disse.
Questionado sobre a música do novo álbum que deseja tocar ao vivo nos próximos shows, Kiko Loureiro optou por uma faixa desafiadora: “Night Stalkers”, parceria do Megadeth com Ice-T. “É bem rápida, vai ser desafiadora para tocar ao vivo, não que vai ser divertida (risos). Acho que a questão de tocar músicas novas nos shows é legal porque tem um desafio, você tem que aprender a música de novo, relembrar, porque as pessoas acham que só porque gravou já sai tocando em qualquer momento e não, você tem que estudar a música, lembrar, treinar as partes”, explicou. “E também pra você ter essa resposta do público na hora e ver se a música funciona ao vivo, porque tem música que é legal de ouvir mas ela não funciona ao vivo. E tem música que surpreende”.
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