Kiko Loureiro é um dos grandes guitarristas do cenário do metal brasileiro.

Além de bons trabalhos solo, o músico participou, durante muitos anos, do Angra, sendo o responsável por álbuns consagrados como Angels Cry (1993) e Holy Land (1996).

Em tempos mais recentes, assumiu o posto de guitarrista do Megadeth, gravando os dois álbuns mais novos da banda, Dystopia (2016) e The Sick, the Dying… and the Dead! (2022). Em 2023, anunciou sua saída do grupo norte-americano, sendo substituído por Teemu Mäntysaari.

Atualmente com sua carreira solo, ele vem ao Brasil para uma turnê e participará do Best Of Blues And Rock, na edição que acontece no Rio de Janeiro, no dia 21 de junho, no Vivo Rio. Além deste, o festival também acontece em São Paulo, Curitiba e Belo Horizonte, com uma série de artistas.

Os ingressos para o evento estão disponíveis no site oficial da Eventim.

Em entrevista exclusiva com o Wikimetal, Loureiro comentou sobre essa nova fase de sua vida, a relevância dos álbuns do Angra, as diferenças entre o mercado de música no Brasil e na Finlândia e mais!

Confira a entrevista na íntegra:

Wikimetal: Como estão as expectativas pra essa nova fase da sua vida que você tá seguindo essa carreira solo?

Kiko Loureiro: Ah, tá ótimo, tá ótimo. Assim, eu já passo esse trabalho solo, de álbuns com meu nome, eu já faço faz tempo. Já fiz vários shows desse tipo. O que tá diferente é que não tem uma outra banda que eu faço, que tá em primeiro plano, né? Antes eu tinha o Angra de primeiro plano, depois o Megadeth de primeiro plano, e eu ia colocando essas coisas de carreira solo, nas entrelinhas. Entre as turnês e tal. E agora tá como principal, então é um desafio. De você continuar fazendo isso, mas ao mesmo tempo, tem uma liberdade de você conseguir marcar, fazer shows e não precisar esperar. Tipo, o que que a banda vai fazer pra depois você marcar. Te dá uma liberdade de você dar uns voos mais altos e ter convidados e sei lá. E aí, no caso, agora, fazer uma turnê inteira no Brasil, ter um festival no Rio e depois vou fazer uma turnê, vou ficar um tempo no Brasil, então dá essa liberdade geográfica e de tempo também

WM: Você fez parte do Megadeth durante anos e definitivamente marcou a história da banda. Você se vê voltando a tocar com eles em algum momento?

KL: Eu não tenho nenhum… não teve nenhum problema, né, com eles ou alguma má… não teve nada disso, mágoa ou destrato de alguma forma, não teve nada. Foi uma questão pessoal minha, entendeu? Então, nesse sentido, não tem problema nenhum, mas é uma coisa… não é uma coisa que passa pela minha cabeça. Porque senão eu não teria feito a decisão que eu tive, né? Mas se a pergunta é “ah, teve alguma briga, alguma coisa que a gente não tá sabendo e tal e aí você nunca voltaria” ou tá esperando alguma resposta assim, não. Tipo, eu gosto de todo mundo, super na boa com todos, da banda, da equipe, do manager, da família do [Dave] Mustaine, que também tava bem próximo. Então, nesse sentido aí, tá sempre de portas abertas. Mas agora não faz sentido na minha vida, entendeu?

WM: Você já tem uma carreira bem longa e consolidada, participando de trabalhos diferentes. O que você faz para se manter atualizado dentro do mundo da música em uma constante evolução?

KL: Essa é uma ótima pergunta, porque as coisas mudam né, e a gente vai observando tipo, você pegar lá no começo do Angra como que era o mercado de música, de shows mudou também, mas não não tão drasticamente quanto a parte da indústria fonográfica, e a gente viveu todas essas essas mudanças aí de CD, de DVD, de Napster, de MP3, de Spotify. Todas essas social media, TikTok e tal. Então, você vai observando e vai vendo como você se encaixa nisso aí. Acho que faz parte da carreira de qualquer artista. Mesmo os novos que estão chegando ali, eles têm que entender como funciona e têm que saber que vai mudar. A única coisa que a gente sabe é que as coisas mudam. Tem que estar sempre observando.

WM: O Angra lançou agora em 2023 o álbum Cycles of Pain. Como é para você fazer essas participações especiais com a banda?

KL: Desde que eu saí, eles fizeram dois álbuns, eu fiz um solo para cada um dos álbuns. Como eu tava muito em turnê, nunca calhou de participar, sabe, de fazer algum show com eles, mas poderia ter feito. Gostaria de fazer, pode ser que aconteça, de fazer uma participação especial. Não calhou porque eu moro fora. Turnê com o Megadeth direto, então era… eu tenho filho pequeno, era sempre uma coisa mais complexa de fazer acontecer. Foi sempre mais simples, mais tranquilo fazer um solo nos álbuns, porque você pode fazer o solo de onde você estiver, né, no meio da turnê e tudo mais. Então foi o que aconteceu até agora, porque eu sou amigo de todos, tenho orgulho da carreira que eu fiz com o Angra, dos fãs do Angra no Brasil, etc, entendeu? Agora nessa tour, vou com certeza tocar músicas minhas, tocar a música do Megadeth que eu participei, tocar a música do Angra, então a ideia do meu repertório nos shows vai ser um compilado dessas, todas essas minhas facetas, digamos assim. Da minha história em si.

WM: E ainda falando sobre a banda, o que você acha que faz alguns álbuns como Angels Cry e Holy Land serem tão impactantes e importantes mesmo após 20 anos de seus lançamentos?

KL: Deixa eu pensar. Eu acho que é difícil saber, né? Porque se a gente soubesse a forma, a gente repetiria. Mas eu acho que tem alguma coisa que a gente às vezes nem… sei lá se a palavra “mágica” não fica muito… mas é um lance do momento ali da energia do tipo, tem uma coisa da inocência um pouco né, tá começando e achar que pode fazer um monte de coisa diferente, tem uma questão da época de como foi feito. Pra esses álbuns aí, também o outros né, o Rebirth (2001), o Temple Of Shadows (2004). E como a banda, ela continua, né? E eu falo também pelo Megadeth, que tem uns álbuns icônicos também dessa era, os meus próprios álbuns solos, alguns que eu fiz que ficaram marcados e a galera pede as músicas, difícil explicar por que a coisa fica, por que a coisa pega. A gente vai fazendo e, sabe, a gente faz do jeito que a gente acredita que é legal, no caso pra mim. Das músicas, da banda, que a gente acredita naquilo que a gente tá fazendo e faz com afinco, com toda dedicação. E fica esperando pra ver as pessoas que conectam. E alguns álbuns conectam mais que outros. É muito louco isso, mas eu não sei explicar, não.

WM: Observando o cenário de metal finlandês em comparação ao brasileiro, o que você comentaria que são as principais diferenças?

KL: A principal diferença, vamo ver. É que assim, a Finlândia é um país pequeno. É um país com… é pequeno, né? Tem 5 milhões de pessoas aqui. Então, tem uma cultura forte que vem do Kalevala, aquela coisa meio nórdica e tal. Mas, é muito influenciado pela música europeia, música americana, inglesa e tal. O rock acaba sendo muito presente no dia a dia, isso é muito louco, você tá, sei lá, num lugar, tá tocando Dio, tá tocando Black Sabbath, tá tocando Gojira, entendeu? Num lugar nada a ver, tipo, show do Nightwish vai as famílias verem. Uma coisa meio que metal é meio parte da música normal, digamos assim, que as pessoas ouvem. E você vê bastante galera com camiseta de banda, você vê bastante aqui. Tem uma cultura metal. Se isso é bom, se isso é ruim, pra mim, eu me sinto à vontade. Você sempre vê alguém com camiseta do Slayer na rua, alguma coisa. É um país bem metal. Mas, ao mesmo tempo, também reflete que não tem uma cultura muito forte própria, que nem a do Brasil. É isso, né? Tem esse lado positivo, porque eu gosto do estilo, então é legal, me sinto à vontade. Tem espaço aqui. Tem uns shows e tal, festivais. Mas ao mesmo tempo, você vê que fica um país muito influenciado por coisas de fora. Apesar de ter ótimas bandas que saíram daqui. Outra coisa que é muito diferente aqui, comparado com o Brasil, é que você tem música nas escolas. As escolas públicas tem música, banda. Então todo mundo, tipo, todo mundo, 100% da população, em algum momento, aprende um instrumento, mesmo que básico, entendeu? E aprende e roda dentro de instrumentos de banda, então aprende um pouquinho de teclado, um pouquinho de guitarra, um pouquinho de baixo, um pouquinho de bateria, um pouquinho de bater palma, de fazer alguma coisa corporal assim. Então, pra você fomentar, você tendo isso na cultura, na base da educação, você vai gerar um monte de músico. Essa pra mim é a grande diferença. Todo mundo meio que toca um pouco aqui e acaba gerando vários músicos muito bons e deixa a parte do metal forte. Mas também bandas hipsters de pop, também é forte, bandas compositores para videogame também é forte, música erudita nem se fala, os maestros que saem daqui, vão reger orquestra pelo mundo afora, o nível é altíssimo. É uma coisa de cultura, de investimento do Estado na cultura das crianças. E você vê refletindo em todas as áreas musicais. Aí você vê, por isso que tem num país de 5 milhões de habitantes, você vê, a gente pode citar aqui, facilmente, umas 10 bandas de metal. Tipo NightwishChildren Of BodomSonata ArcticaStratovariusAmorphis e por aí vai. E no Brasil não tem, né? No Brasil não tem tantas. Porque tem o lado da música brasileira ser forte e a galera… e também porque não tem esse fomento cultural mesmo da educação pública. E equipamento e tal. Porque você tocar heavy metal ou rock, você precisa de uma guitarra, de um ampli, de um cabo, de um pedal, ou bateria, mesma coisa. Já precisa de uma capacidade econômica diferenciada, entendeu? E aqui você tem em todo o bairro uma biblioteca que tem instrumentos para você pegar emprestado, uma guitarra, um violão, não sei o quê. Então, isso, pô, tem tudo na mão, né? Isso vai gerar lá na frente um resultado desse, de várias bandas, vários músicos, etc.

WM: Olhando para trás, durante todos esses anos, qual momento você destacaria, que você parou e pensou, “nossa, eu consegui”?

KL: Eu não penso muito nisso não, porque tem sempre um desafio novo, né? Que você fala, “pô, podia ser que eu fosse assim. Vou conseguir”, mas… Na primeira vez que a gente foi gravar Angels Cry, de gravar fora do Brasil, na Alemanha, já era tipo, “nossa, tamo indo pra Alemanha”, entendeu? Quando vai fazer a primeira tour fora, “pô, que legal”. Quando a gente tocou no Monsters of Rock, que foi um festival que teve no Estádio Pacaembu, que a gente tava abrindo lá, falando, “nossa, tamo tocando aqui”. Antes do, era o Kiss, eu acho, Black Sabbath, Slayer, então assim, todos os momentos, quando… aí depois foi gravar o próximo álbum, quando foi gravar com a orquestra no Abbey Road lá, no Fireworks. Quando o Bruce Dickinson cantou com a gente, veio participar do nosso show, porque ele achava que era importante ele tá no show do Angra, e por aí vai, quando eu entrei no Megadeth, etc. Os shows que eu fiz com o Megadeth de headliner em vários festivais ou Madison Square Garden, em casa de show assim, Budokan e tal. Tudo isso é pontual. E vai formando essa… As coisas estão acontecendo. Que bom. Todo esforço tá sendo, o esforço que eu tive, porque ao mesmo tempo as pessoas veem esses pontos, não veem o dia-a-dia, estudando, tocando, treinando, respondendo e-mail, falando com as pessoas, fazendo corre, dirigindo, fazendo entrevista. Tem tudo isso. Então, meio que você aposta, bota bastante energia e você quer ver, e acaba tendo o resultado. O que te dá mais energia para continuar indo.

WM: Você vem para o Brasil para tocar no festival Best of Blues and Rock, como estão as expectativas?

KL: Ah, muito boas, porque faz tempo que eu, eu fui para o Brasil rapidamente em novembro, ano passado, mas teve toda a pandemia, tudo aquilo, eu não viajei, e aí teve muita turnê com o Megadeth nos Estados Unidos, e eu fiquei muito fora, desconectado do Brasil. E, pô, eu tô indo agora pra ficar… vou ficar o quê? Dois meses e meio no Brasil. Então, tipo, eu vou fazer um mix de shows e um pouco de férias e amigos e família e rever os fãs, rever tudo, viver, comer na padaria, aquela coisa toda. Engloba tudo, não é só o festival. O festival, obviamente, é legal demais, porque… o pessoal que eu conheço, o Zakk Wyldejá tive a oportunidade de tocar com ele em outros festivais, tal. O Joe Bonamassa, que eu sou fã. O festival tá com várias atuações, o Eric Gales, eu não conheço pessoalmente. Mas sou fãzasso do trabalho dele. Tantos outros artistas que vão tá. Isso é fantástico. E, no caso, eu vou fazer na edição do Rio de Janeiro e, cidade natal, né? Que eu nasci no Rio, mas sou um carioca meio… fajuto, né? Porque eu cresci em São Paulo. Mas é de sempre ter um carinho especial pelo Rio de Janeiro, etc. Isso aí vai ser muito legal. E vai ser o primeiro show dessa leva. Que eu tô indo pro Brasil. Então, é desafiador ao mesmo tempo, de já começar a tour com um show desse porte. 

WM: E depois da sua passagem pelo Brasil, o que você planeja fazer?

KL: Bom, tenho vários pedidos de continuar fazendo turnê na América Latina, ir na Europa, já tenho conversa para ir para o Japão. Eu não posso falar ainda de datas nem nada porque não tem nada 100% já assinado e definido e tal. Mas eu fiz muita tour nos últimos anos, então eu vou fazer… eu tô estudando bem esse lance de tour e tenho um álbum novo pra sair. Que vai sair em breve e vou me dedicar ao seu lançamento do álbum aí, a partir desse momento e aí sim marcar também tours pra divulgar esse álbum e continuar o novo ciclo.

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Fã de rock desde muito cedo, é estudante de jornalismo e trabalha, também, criando conteúdo para a internet. Já foi host de podcast e atualmente está completamente focada na área de jornalismo especializado. Apaixonada por música, é entusiasta, em especial, do hard rock e heavy metal.