Dia 19 de outubro a Eskröta vai fazer o chão de São Paulo tremer com seu metal feminino e feminista. Feminino porque a maior parte da banda é composta por mulheres, mas antes de assistir a um show é importante desconstruir qualquer tipo de associação dessa palavra à delicadeza ou passividade. O feminino da Eskröta é forte, poderoso, agressivo e tem muito a dizer – especialmente em defesa das mulheres.

Formada atualmente por Yasmin Amaral (vocal e guitarra), Tamyris Leopoldo (baixo) e Jhon França (bateria), a Eskröta é uma banda declaradamente feminista, antifascista e antirracista; e suas letras reforçam esse posicionamento da forma mais direta possível, sempre fazendo comentários sociais e políticos. Seu álbum mais recente, Atenciosamente, Eskröta (2023), aborda temas que vão desde críticas à necessidade de performar uma vida perfeita nas redes sociais, até questionamentos raivosos sobre a  fome e o desemprego que assolam as classes mais pobres.

Em setembro, o trio se apresentou pela primeira vez no Palco Supernova do Rock In Rio, dividindo tempo de palco com a The Mönic. Apesar do medo de tocar para uma plateia vazia devido ao horário e localização do palco, a experiência foi um “sonho realizado” e se transformou em “um dos melhores shows que a gente já fez na vida”, com público robusto e bastante engajado. 

A parceria entre as duas bandas inicialmente se repetiria no mesmo formato no Knotfest Brasil, em dia único, mas recentemente ambos os nomes ganharam dias separados e espaço individual na line-up do festival. A Eskröta se apresenta no sábado, 19 de outubro, enquanto a The Mönic fica para o domingo, dia 20, mas ambas as bandas garantem participação no show uma da outra. Quem quiser curtir o peso da Eskröta de perto vai ter que chegar cedo. E quem espera algo semelhante a o que foi apresentado no Rock in Rio, se engana.

“O Rock in Rio é um festival que não tem tanto foco no metal”, explica Tamy em entrevista ao Wikimetal. “O Knotfest já é bem mais para quem curte um som mais pesado e a Eskröta tem músicas mais pesadas. Eu acho que no Rock in Rio a gente fez um geralzão da carreira, trouxe músicas antigas pra apresentar a trajetória da banda. No Knotfest, estamos estudando trazer músicas mais pesadas que não estavam no repertório do Rock in Rio.”

Formada em 2017, quando Yasmin e Tamy já eram adultas e queriam tratar a banda com seriedade, a Eskröta surgiu com o propósito de comentar assuntos vividos pelas integrantes ou compartilhados entre amigas. Assuntos esses que variavam entre temas como violência obstétrica – vivida por amigas que são mães – até o cenário que se desenhava na política da época, com a eleição presencial de 2018 se aproximando. “Foi um momento das nossas vidas em que estávamos querendo falar sobre o que a gente passava. E também um momento na sociedade em que eu acho que era impossível ficar meio em cima do muro, pelo menos pra gente”, comenta Yas.

As ideias da banda logo foram abraçadas pelos grupos antifascistas da cena do metal e o trabalho da Eskröta começou a ganhar mais visibilidade e um público que compartilhava dos mesmos pensamentos. No início, em um formato pré-pandêmico, os shows da banda costumavam ser precedidos por rodas de conversa entre mulheres para abordar pautas e vivências que dialogassem com o discurso das integrantes e mostrassem sua perspectiva.

Por serem tão abertas com suas visões de mundo e escancarar suas opiniões políticas em suas músicas, a Eskröta entende que enfrentar certa resistência faz parte do jogo. A banda já está acostumada com as reclamações por parte dos “dinossauros do rock”, como fala Tamy, mas também já enfrentou situações delicadas que causaram empecilhos, como ter o show proibido ou censurado em cidades regidas por partidos de direita, por conta de seu posicionamento político. “A primeira vez que fizemos show em Blumenau, falaram pra gente: ‘Ó, vamos tentar falar um pouquinho menos sobre antifascismo’”, conta Yasmin. “Enquanto dessa vez,  quando a gente voltou, a gente já voltou mais sem medo, sabe?”

“Às vezes fica um pouco difícil ser amigo de todo mundo quando você tem uma posição bem definida”, reflete. “Algumas bandas acabam ficando em cima do muro para ter mais portas abertas, para poder estar em todos os lugares e ser amigo de todo mundo, de fato. Enquanto quando você tem uma posição, algumas portas se fecham, algumas pessoas não querem se envolver com você, você às vezes fica num cerco de polêmica. Tem um pouco disso também quando você se posiciona, tem lugares em que você não vai entrar e eu acho que nem deveria e tudo bem, sabe? Tem espaços em que você não precisa estar só porque tá rolando som. Eu acho que a gente também tem o lado bom de conseguirmos escolher melhor alguns lugares que não queremos frequentar.”

Encontrar o equilíbrio entre seguir firme com seus posicionamentos e tentar ganhar mais espaço na mídia e em grandes festivais, porém, é um desafio constante para a Eskröta. Em sua setlist para o Rock in Rio, por exemplo, elas procuraram escolher com cuidado as músicas que tocariam, deixando de lado algumas das mais confrontadoras, porque algumas composições poderiam parecer um pouco “assustadoras” para quem ainda não as conhece. “São coisas que a gente pensa. Porque a gente precisa fazer com que as pessoas conheçam a banda e se identifiquem. Mas se a gente entra por uma porta errada, às vezes [essa porta] pode bater”, explica Yas.

“Nós já aceitamos que não precisamos estar em alguns lugares, mas nós lutamos por aqueles que a gente acredita que tem espaço”, continua. “Sem contar que a gente também tenta ir de grão em grão. Não é só de festival que se faz uma banda, não é só de show. É também ir em outros shows, [estar] conversando com várias pessoas, estando presente nas redes sociais. Então a gente tenta capilarizar para não ficar dependendo só das outras pessoas convidarem a gente, para mostrar que tem público, que tem gente que gosta, e fazer essa mensagem chegar em mais pessoas.”

Com 7 anos de banda, a Eskröta atualmente já tem uma base de fãs sólida o suficiente para ser uma banda mais “autossustentável”, sem precisar tirar recursos financeiros do próprio bolso para continuar rodando. A participação em festivais como o Rock In Rio e Knotfest Brasil abriram possibilidades para sonhos maiores, como tocar em festivais internacionais, e possivelmente até tentar lançar canções em inglês para expandir as fronteiras de seu público. “A gente tá chegando e caminhando devagarzinho, de grão em grão, como a Yas falou, mas a gente é bem ambiciosa”, comenta Tamyris. “A gente quer – pelo menos eu quero, e acho que a Yas também – ser muito uma mainstream. É um sonho nosso, ocupar mais espaços e [ter mais] reconhecimento.”