Accept e heavy metal são sinônimos em mais aspectos do que a simples condição de “clássico” do gênero poderia demonstrar, mas talvez o título do disco Too Mean To Die explique bem.
Assim como o gênero no qual se tornou clássica, a banda é “malvada demais para morrer” e segue conquistando novas gerações de fãs ao redor do globo.
Conhecida pelo som feroz e rápido de clássicos como “Balls to the Wall”, o Accept de hoje conta apenas com o guitarrista Wolf Hoffman como membro original, mas o DNA do som segue presente nas composições.
Em entrevista ao Wikimetal, Hoffman falou sobre o álbum, os novos tempos para o metal e o retorno da banda ao Brasil, como atração do festival Summer Breeze.
LEIA TAMBÉM: Entrevista: Rise Against fala sobre Lollapaloza Brasil e as dores da nova geração
Wikimetal: Vocês fizeram uma turnê pela Europa recentemente, certo?
Wolf Hoffman: Isso mesmo. Passamos dois meses em turnê pela Europa e foi um sucesso fantástico. Foram 30 shows e quase todos esgotados, muito cheios e foi incrível.
WM: O novo álbum está muito bom, gosto muito quando as bandas clássicas mantém a agressividade e personalidade em novos lançamentos. Como vocês mantêm essa energia no estúdio?
WH: Acho que acontece automaticamente porque amamos o que fazemos e acontece. Quero dizer, se é o mesmo que subir no palco e há uma certa energia que acontece quando você começa a tocar e consegue aquela vibração de energia do público, então isso te anima. No estúdio, você quase tem isso na sua mente de um jeito estranho. Na minha mente, já estou no palco, consigo visualizar os fãs. [Me pergunto], ‘Isso vai funcionar bem ao vivo?’ Quase consigo ver a plateia pulando na minha frente, não é algo isolado de estar em estúdio ou não, você ainda tem essa conexão na mente porque quer tocar essas músicas no palco um dia.
WM: Mas conforme os anos passam, as bandas não conseguem tocar tudo que já lançaram… Como você equilibra o que o público quer e suas favoritas pessoais ao criar uma setlist?
WH: Vou te contar um segredo. Eu realmente não me importo com as minhas favoritas ou a preferência de mais ninguém na banda. Só me importo com o público. Se a plateia gosta de uma música, é essa que vamos tocar. Não estou em turnê para agradar meu ego, estou na estrada para agradar os fãs. Se eles estão felizes, vão nos fazer felizes, é essa relação de Yin Yang, que vai e volta. Basicamente, escolho as músicas que causam as melhores reações nos fãs e não necessariamente algo que eu queira tocar, quem quer ouvir isso? Eu não!
WM: Sim, isso é incrível. Bom, falando sobre o disco, gosto de como as letras discutem temas atuais da sociedade de forma interessante, como em “No One’s Master”, por exemplo. Ao mesmo tempo, você já falou em entrevistas sobre como todos na banda possuem diferentes visões e evitam ser políticos demais. Como isso funciona?
WH: Funciona muito bem porque simplesmente não falamos sobre a política atual, especialmente na América, onde eu nosso cantor, Mark, moramos. É quase uma regra não escrita. Temos visões de mundo diferentes. Sabe, eu venho da Alemanha, da Europa, onde as coisas são um pouco mais para o lado social, tenho a visão de que estamos todos no mesmo barco e dependemos uns dos outros. Mas na América também há essa visão muito oposta de cada um por si. E o público americano em geral está muito dividido, essa é uma tendência infeliz. Parece não haver mais meio termo, e o mesmo pode ser dito para a Europa. Geralmente há dois pontos de vista opostos extremos sobre qualquer assunto.
Quero dizer, olhe para a situação atual como a guerra da Ucrânia, tentamos não dizer nada sobre isso porque amamos nossos fãs russos tanto quanto gostamos de nossos fãs ucranianos. Sobre tomar partido, mesmo que individualmente, tenho uma visão muito clara sobre isso: enquanto músico, acho errado falar sobre essas coisas porque alô, somos apenas músicos, sabe? Como eu disse, mesmo nas letras, nós tentamos não escolher um lado sempre que possível. Às vezes você não pode evitar e meio que acontece porque sempre que você expressa uma opinião. Alguém pode não gostar, mas pelo menos estamos tentando ficar longe das questões divisórias e os assuntos mais polêmicos do momento.
WM: Entendo, realmente existe muita polarização. Mas confesso que pensei nos políticos brasileiros que mais odeio quando escutei “Sucks To Be You”. Como você lida com as interpretações do público com as músicas depois de lançadas? Cada pessoa interpreta de um jeito.
WH: É isso que essa música é! Não foi feita para uma pessoa específica porque cada ouvinte, como você acabou de dizer, pensa naquela pessoa na própria vida e diz: ‘É, essa aqui foi escrita para você’. Não nomeamos ninguém, então escolha seu político favorito, vizinho ou qualquer pessoa que seja para oferecer essa música.
LEIA TAMBÉM: Do hardcore ao doom: entrevista com Flávio Cavichioli
WM: Sim, pode deixar! Acredito que existem muitos fãs jovens descobrindo metal hoje em dia. Sempre falamos sobre como o rock está morrendo e como o metal não é o mesmo de antes, mas vejo que temos uma geração completamente nova descobrindo as bandas. Você percebe isso nos shows?
WH: Especialmente neste último show que fizemos na Europa, nunca vi tantos jovens em nosso público como desta vez. Quero dizer, a maioria dos fãs nos segue há gerações, por décadas. Mas há muitos jovens na plateia agora, e às vezes não consigo deixar de me perguntar: ‘O que eles estão fazendo aqui? Como descobriram Accept?’. Quero dizer, estou muito feliz por eles estarem lá e quanto mais, melhor. Mas não posso deixar de me perguntar como eles surgiram.. E isso me deixa muito feliz. Acho que eles estão nas redes sociais e resolvem olhar a coleção de discos dos pais, tios ou alguém, não sei. Mas é ótimo que eles descubram esse heavy metal tradicional. É muito incrível.
WM: Falando agora sobre ética de trabalho na banda, gostaria de saber o maior desafio em seguir em frente após várias mudanças na formação.
WH: Um dos desafios é manter a banda fiel ao sabor original, se quiser chamar assim. Sabe, começamos como uma banda alemã, temos influências alemãs, nossa música soa um pouco alemã, sempre foi assim e eu quero manter isso… Mesmo se tivermos um cantor e membros americanos na banda agora.
Portanto, há alguns elementos que eu realmente gosto de manter e tenho uma grande ajuda de Andy Sneap, nosso produtor. Quando ele entrou a bordo há cerca de cinco álbuns, ele foi muito útil na definição. Quando eu escrevo músicas, isso pode facilmente se transformar, mas ele me ajudou a manter o rumo. Atualmente, depois de tantos anos, estou bem ciente do que soa como Accept ou não. E o desafio é sempre tentar soar fiel à sua linhagem e à sua herança, mas ao mesmo tempo você queria soar novo, excitante e fresco. Então, meu lema quando estamos escrevendo e gravando músicas é sempre que eu queria soar como se eu pudesse ter escrito em 1983, mas não escrevi [nessa época]. E isso é algo que não é muito fácil de fazer depois que você já gravou 15 ou 16 álbuns, porque você realmente não quer se repetir.
É um pouco desafiador e com mudanças de formação, penso que começamos juntos neste navio há tantos anos atrás, mas com o tempo, algumas pessoas deixaram o navio e eu sou o único cara da tripulação original. Mas eu ainda mantenho o navio em frente e sem sair do curso, mesmo que haja novos membros na equipe. E eu sinto que essa é a minha missão na vida, manter aquele navio seguindo em frente, através de águas agitadas e tempestades.Aí está a sua metáfora para o dia.
WM: Agora vamos falar um pouco sobre o retorno do Accept ao Brasil. Nós, fãs brasileiros, sempre gostamos de saber se as bandas guardam alguma lembrança especial do nosso país.
WH: Eu amo ir ao Brasil. Vou contar uma coisinha. Já estivemos em São Paulo, Curitiba e em muitos lugares. Mas um lugar que foi especial para mim foi Manaus. É um ótimo lugar para se visitar, com certeza, mas há um antigo teatro que foi construído na época da exploração de borracha. Esse lugar fazia parte de um filme muito famoso na Alemanha [chamado Fitzcarraldo] com os atores Claudia Cardinale e Klaus Kinski. Foi filmado nesse teatro histórico naquela Manaus e fiquei bem maravilhado de ver… Entramos lá e isso significou muito para mim por causa daquele filme. É um filme famoso na Alemanha, me lembro de ir para esta cidade distante e ver o teatro pessoalmente.
Mas é claro que temos memórias fantásticas de apenas fazer shows no Brasil, o público brasileiro adora cantar junto. Eles cantam até os solos de guitarra e tudo mais!
WM: Eu achava que todos os públicos faziam isso! Como não?
WH: É ótimo, eu gostaria que todos fizessem isso. Mas é claro que sempre há um pouco de rivalidade porque os argentinos, por exemplo, acham que são o melhor público e os brasileiros também, então existe aquela coisa de competição amigável entre vizinhos, sabe? Eu acho fantástico. Quanto mais, melhor.
WM: Estamos muito animados também para a primeira edição do Summer Breeze Festival aqui no Brasil. O Accept será a atração principal do Sun Stage, que tem boas bandas novas se apresentando. Você costuma ouvir novas bandas de heavy metal?
WH: Não, eu não faço isso. Desculpa. Essa é a resposta curta. Claro que sou exposto a muitas bandas quando fazemos turnês em festivais e coisas assim, mas pessoalmente não sou o cara que segue as novidades ou que sai por aí e assiste a todas essas bandas. Eu não sei o motivo. Estou sempre ocupado dando entrevistas, escrevendo músicas e estou 100% consumido como Accept. E eu realmente não encontro tempo ou prazer em sair por aí e conferir todas essas bandas. Confesso que não sou muito consumidor. Desculpe.
WM: Então o que está na sua playlist? Você tem uma?
WH: Não de verdade, para ser honesto. Eu ouço muita música clássica e um monte de streaming.Às vezes, quando estou em casa trabalhando, ouço techno cubano. Quão estranho é isso? Mas muitas vezes é apenas música clássica, Tchaikovsky e Beethoven e coisas assim que sempre amei ao longo dos anos.
WM: Para finalizar, você diria que o metal é malvado demais para morrer?
WH: Absolutamente. O metal foi riscado tantas vezes. Lembro que nos anos 1990, todo mundo dizia que o heavy metal estava morto e nunca mais voltaria. E aqui estamos todos esses anos depois e o estilo ainda está forte, em alguns casos mais fortes do que nunca. Então, o Accept em si é malvado demais para morrer, mas acho que o gênero heavy metal é certamente malvado demais para morrer também.
Os ingressos para o Summer Breeze Brasil já estão à venda no site da Ticket360. Use o cupom ‘WIKIMETAL20’ (sem aspas) na categoria Summer Card Social e ganhe 20% de desconto até dia 20 de março.
LEIA TAMBÉM:Entrevista Stryper: Michael Sweet fala sobre religião, novo álbum e planos para futuro