Aborted convida o público para uma experiência brutal e potencialmente enlouquecedora em ManiaCult, décimo primeiro álbum de estúdio da banda belga, que será lançado nesta sexta-feira, 10 de setembro, pela Century Media Records. 

O trabalho é ambientado para acompanhar uma seita doentia, narrando os sacrifícios humanos exigidos para invocar demônios Lovecraftianos. O líder deste culto sinistro é  Wayland Thurston, retirado diretamente das histórias de H.P. Lovecraft, dominado por um verme que se instalou em suas costas. 

Em entrevista ao Wikimetal sobre o novo projeto, o vocalista Sven de Caluwé comentou as inspirações para o novo álbum, estereótipos criados sobre o death metal e o novo momento da banda. 

A banda passou por algumas adaptações no último ano: o guitarrista Mendel bij de Leij deixou o grupo, em 2019, após sete anos na banda. O grupo convocou Harrison Patuto para a turnê que realizaria ano passado, mas com o cancelamento dos planos, decidiram seguir como um quarteto: Ken Bedene (bateria), Ian Jekelis (guitarra) e Stefano Franceschini (baixo).

Essa formação foi responsável por La Grande Masquerade, EP lançado em 2020, e agora o Aborted gravou o primeiro álbum com essa dinâmica. “Nós apenas nos livramos de alguém, então são as mesmas pessoas do último álbum. Para ser honesto, não mudou muita coisa, fizemos essa mudança porque algumas coisas não estavam acontecendo. O cara não estava contribuindo com nada, fizemos todo o trabalho apenas nós quatro. Fizemos tudo assim, então foi bem normal para nós”, explicou o vocalista. 

Com integrantes em diferentes países, a banda está acostumada a trabalhar de forma remota, mas a pandemia ainda trouxe desafios entre os cancelamentos de shows e a gravação individual, sem ensaios presenciais. “Estou animado para o retorno de tudo e fazer shows novamente um dia, sabe? Seria ótimo. Quando fizermos o próximo show, terá completado dois anos desde que vi os integrantes da banda pela última vez”, desabafou. 

A rotina do Aborted teve algumas alterações nesse período, com chamadas de vídeo regulares “para saber como cada um estava” e começar a composição do álbum. “Você tem duas opções: ficar deprimido e se cagar ou superar, escolhemos a segunda opção”, continuou. “Geralmente, todos nos encontramos e passamos um mês no estúdio para gravar. Foi bom e ruim ao mesmo tempo, mas tudo deu certo e estamos muito felizes com o resultado”. 

Nas entrelinhas dos acontecimentos nauseantes descritos nas faixas, ManiaCult também aborda temas de cunho mais político – mas Caluwé é rápido para rechaçar esse termo. “Político não!”, interrompe rapidamente. Apesar das negativas, o disco passa por temáticas atuais e de cunho político e social, ainda que não seja partidário: a trama nefasta levanta debates sobre saúde mental, polarização, redes de fake news, controle da Igreja sobre as massas. Não seriam esses temas politizados, também?

“Eu não diria que são tão políticos, o tema principal é sobre saúde mental, todas as merdas loucas que estão acontecendo nesses últimos anos. É sobre meu olhar ao assistir tudo isso e me questionando: ‘Como isso é possível?’”, reflete o líder da banda. “Não estou escolhendo nenhuma posição do ponto de vista político, especialmente porque não estou aqui para pregar nada ou dividir as pessoas, mas o que me incomoda mais ao longo do álbum é que estamos muito polarizados enquanto sociedade e se tornou impossível simplesmente ter uma discussão, discordar e ainda manter amizade [quando se trata] de política ou religião. Parece que mantemos uma arma carregada [o tempo todo], não pode ser apenas uma troca de ideias sem uma briga. São extremos e acho que isso é um problema”. 

As mensagens atuais seguem nos visuais do projeto. No lyric video de “ManiaCult”, todos esses temas são traduzidos em manchetes bizarras e perturbadoras sobre atualidades, enquanto o clipe de “Impetus Odi” traz uma representação literal e sanguinária do poder de controle das instituições religiosas na sociedade. 

Em faixas como “Drag Me to Hell”, por exemplo, interpretações mais amplas realmente não fazem sentido: como o próprio nome dá a entender, se trata apenas de uma música baseada na trama do filme Arraste-Me para o Inferno (2009), do diretor Sam Raimi, um longa que Sven indica. “Você precisa manter em mente que tudo é pensado para ser artificial, exagerado e bobo. Tem tanta merda acontecendo naquele filme, é hilário! O tanto de coisas idiotas que acontecem com aquela garota… Você devia dar uma chance ao filme”, respondeu. 

ManiaCult tem a trilha sonora ideal para os acontecimentos funestos narrados nas letras, mas também combina com os tempos de obscuridade ao redor do mundo. Com vocais impressionantes de Sven, explorando as regiões mais altas e a técnica impressionante do gutural – às vezes ao ponto de nem mesmo soar humano-, o disco é brutal e sombrio sem perder melodias hipnóticas. 

Ao longo das 11 faixas, a banda mergulha em novos níveis de brutalidade, abrindo as portas do reino da loucura no campo lírico e sonoro, mas com lucidez de profissionais com excelência técnica e grande conhecimento dentro do gênero.

Para divulgação de ManiaCult, o grupo pensou em uma estratégia completamente diferente: Wayland Thurston, a persona que lidera o culto maligno da narrativa do álbum e também funciona como uma metáfora para questões de saúde mental foi transformado em um boneco colecionável exclusivo do Aborted. Com filtro nas redes sociais, o personagem ganha vida para além da capa e dos clipes da banda. A merch oficial do novo disco inclui ainda bermudas, camisetas e os discos de vinil, todos disponíveis em pré-venda

Aborted lança action figure com persona de 'ManiaCult'
Aborted lança action figure com persona de ‘ManiaCult’. Crédito: Divulgação

Com 26 anos de carreira, a banda consegue equilibrar os elementos já consagrados na discografia e continuar com inovações. “Nós nos perguntamos isso toda vez que começamos a escrever um novo álbum: ‘O que queremos fazer? Queremos ser mais extremos? Queremos tentar coisas novas? Se sim, quais?’ Isso sempre está em discussão antes de começar”, conta o cantor. “De acordo com a ideia que tivemos, isso surge no caminho. Nesse álbum, queríamos continuar construindo a obscuridade de Retrogore (2016) e TerrorVision (2019), acrescentando mais elementos de black metal e tentando combinar de maneira mais dinâmica para criar o álbum mais interessante que pudéssemos. Dinâmica e variação são as chaves, tentamos incluir isso também”. 

Sendo o único membro original da banda, fundada em 1995, Sven de Caluwé conhece bem os estereótipos criados ao redor do death metal e as temáticas violentas e sangrentas das letras e visuais dos grupos. “É mais difícil quando você está em frente ao público, você tem que ter mais cuidado dependendo de onde está porque, mesmo que você esteja brincando, sempre tem uma chance de alguém se irritar”, refletiu. “Mas eu penso, ‘Quer saber? As pessoas sabem quem eu sou, conhecem meu caráter, se estão em um show do Aborted, eu serei eu mesmo’”. 

Para o vocalista, as reações negativas não passam de “incompreensão” sobre a natureza do trabalho das bandas de música extrema. “Estamos brincando sobre paradas horríveis, nada disso é sério, se você vai a um show de death metal e acha que qualquer pessoa ali está falando sério, desculpe, você tem um problema. Por alguma razão, as pessoas acham que somos todos serial killers”, contou com uma risada. 

Durante uma entrevista na Polônia, durante a primeira turnê da carreira do Aborted, a banda foi questionada sobre o que guardavam no freezer de casa. “Não sei, cara, comida?”, respondeu Sven ao entrevistador. “O cara ficou muito desapontado que eu não disse que tinha cadáveres e cabeças decapitadas e, sei lá, pênis triturados. Você conseguia ver na cara dele o quão decepcionado ele estava. As pessoas realmente acham que nos cortamos e sacrificamos virgens, essas são as coisas mais idiotas e ultrajantes”. 

''ManiaCult', álbum do Aborted
”ManiaCult’, álbum do Aborted. Crédito: Divulgação

Aborted – ManiaCult
1. Verderf
2. ManiaCult
3. Impetus Odi
4. Portal to Vacuity
5. Dementophobia
6. A Vulgar Quagmire
7. Verbolgen
8. Ceremonial Ineptitude
9. Drag me to Hell
10. Grotesque
11. I Prediletti: The Folly of the Gods

Tags:
Categorias: Entrevistas