O terceiro e último dia da nossa cobertura no Rock in Rio 2022 começou desagradavelmente quente e a vontade de largar tudo e ir pro mar (que eu podia ver da janela do apartamento) era real, e confesso sem um pingo de vergonha, que quase sucumbi. Mas o senso de dever falou mais alto no fim e iniciamos a preparação para a empreitada final. Gastei minhas últimas camisetas limpas de cores claras nos dias anteriores e justamente para o dia com o sol que me pareceu o mais escaldante, precisei recorrer à uma das pretas, aquelas mesmo que garantem a absorção da luz do sol como nenhuma outra, caso você não tenha se tocado da gafe. Optei ao menos pela estampa de Edgar Allan Poe, um senhor que também escreveu umas resenhas no seu tempo. Assim, ainda que suando profusamente, ao menos me sentiria meio que apadrinhado e certamente inspirado na missão por completar.

Me sinto na obrigação de justificar o atraso no texto sobre o dito dia do Pop Punk, também conhecido como o quinto dia de Rock in Rio. Por conta de termos voltado aos nossos alojamentos novamente quando já era alta madrugada e de termos que iniciar o processo de volta para São Paulo no dia seguinte, o cronograma de entrega dessa última cobertura sofreu um pouco e peço aqui publicamente desculpas aos meus fiéis leitores que, à essas alturas, motivados por pura paranoia, já começaram a formar grupos de busca para encontrar meu corpo em alguma praia da Barra da Tijuca. Vocês terão que fazer de conta que nada aconteceu depois de sexta. Nada de Coldplay, nem Maria Rita, Camila Cabello, nem Djavan ou Dua Lipa. Façam de conta que nada mais saiu na mídia. Não percam o foco. O que importa é o que saberão através dessas linhas aqui. Mas sem mais delongas, vamos lá:

Nosso derradeiro dia gasto na Cidade do Rock começou com muito sol e muita gente por toda a parte, uma combinação que, longe da praia, não faz o menor sentido, na minha modesta opinião. Fatalmente estes são fatores que poderiam afetar a vontade de fazer festa e até de trabalhar (imagine só!) da maioria das pessoas, e quem sou eu para me apartar da maioria nesse momento? Dito isso, ainda conseguimos passear ao sol e conferir algumas atrações enquanto deixávamos a tarefa bem mais suportável com o auxílio inestimável de alguns copos de chope. Neste espírito desbravador das fervilhantes e ferventes avenidas e vielas da Cidade do Rock, fomos em busca de histórias para contar e fotos para fazer.

Fomos testemunhas de um empolgado e acrobático Can-Can sendo dançado na abertura do palco Rock Street Mediterrâneo, onde logo depois vimos a alegre Terra Celta, banda “residente” ali durante todo o Festival. Presenciamos o multi-instrumentista Rodrigo Sha com seu saxofone indo de Pink Floyd à Hava Nagila num único fôlego, vimos Marvvila e suas convidadas no palco Favela representando a força das mulheres cariocas no pagode e já quando o sol começava a querer cair, nos impressionamos com o cenário e as plataformas móveis que elevaram o cantor Jão e parte de sua orquestra bem ao alto numa manobra realmente inusitada no palco Sunset.

Boa parte da performance de Jão foi planejada como uma homenagem entusiasmada à Cazuza e ao show deste no primeiro Rock in Rio, em 1985, e isso não podia ter mais a ver com a tônica geral do festival e desse dia em especial. Me refiro à todo um esforço conceitual no sentido de reunir o “antigo” e o “novo” que pode ser facilmente observado na ênfase que a comunicação do festival dá a ideia de que toda essa festa pode ser uma coisa para famílias inteiras curtirem juntas. E essa ideia, por mais positiva que pareça, quando o assunto é o “bom e velho” rock and roll, vira polêmica instantânea, afinal, se você entende que parte de ser “do rock” é ser contestador, ir à um show com seu pai, o símbolo de autoridade maior dentro da sua casa, pode soar absurdo aos seus ouvidos. Pais junto com filhos, avós junto com netos, ou, nas palavras de Peter Venkman, dos Caça-Fantasmas: “Sacrifício humano, cães e gatos vivendo juntos, histeria coletiva!”.

Mas não é aqui (e nem em parte alguma, quero crer) que esgotaremos este assunto. De qualquer forma, a reunião do antigo com o novo que o festival gosta de ver e de colocar nos palcos não se limitou à Jão homenageando Cazuza em seu show. Já no início da noite, também no palco Sunset, chegamos ao show denominado “1985: a Homenagem” cuja proposta era precisamente trazer artistas veteranos que tocaram na edição inaugural do Festival para se apresentar junto a artistas novos, com shows escalados na edição atual.

As parcerias renderam momentos bem emocionantes ainda que o show todo tenha ficado meio que como uma colcha de retalhos esquizofrênica, musicalmente falando. Teve Xamã fazendo rimas e reverenciando Ivan Lins que além de cantar trechos de seus maiores sucessos também deu um jeito de se pronunciar politicamente. Nada discretamente, o músico chamou no sinalzinho maroto de “L” com a mão, para delírio daquele coral onipresente no público do festival cuja maestria é na execução da já clássica “Ei, Bolsonaro, vai tomar no cu!”, que obviamente se elevou da multidão uma vez mais. Teve Alceu Valença manipulando magistralmente esse mesmo coral só que com muitos aiaiaiais e oioioiois, teve Pepeu Gomes, Liniker, Blitz, Agnes Nunes, Elba Ramalho e se não estou esquecendo ninguém, ainda teve Andreas Kisser que, entre outras coisas, tocou guitarra para Luiza Sonza cantar “Love of My Life” do Queen, numa homenagem cuja “sacada” o Måneskin sapecamente “sabotou” ao fazer (sem comparações aqui, por favor) a mesma coisa no dia anterior.

Para “1985: A Homenagem” eu estava perto do pit e de uma espécie de área VIP, na frente do palco e acredito que tenha sido a maior concentração de celebridades nacionais por metro quadrado que avistei por ali. Todo mundo muito sorridente, tinha de Chay Suede e João Vicente a Isabeli Fontana e Renata Ceribelli, sem falar do próprio Roberto Medina, idealizador do festival, que passou bem orgulhoso abanando para os pobres mortais espremidinhos na grade de proteção. Pessoalmente sempre me pareceu mais adequado que qualquer tipo de área VIP devesse ficar a uns 300 metros do palco, atrás da house mix e de algumas árvores ou postes de luz, se houverem. Talvez dividindo espaço com a barraquinha de produtos da banda. Só lançando a ideia.

Billy Idol, no Palco Mundo era o show do dia com mais nostalgia envolvida para mim. Nas reuniões dançantes do final dos anos 80, onde (bizarramente para os padrões de hoje), os meninos levavam um refri e as meninas levavam um salgado ou doce, muito dancei agarradinho com “músicas lentas”, como “Eyes Without a Face” ou, bem descoordenadamente, “róques” como “Dancing With Myself” e “Rebel Yell”. O show do britânico de 66 anos, irmão conceitual (ou tio) do nosso querido Supla, ficou longe de ser o melhor da noite, com alguns problemas bem evidentes. A execução de algumas músicas sofreu, a partir justamente daquela de dançar agarradinho que citei antes, “Eyes Without a Face”, quando o músico parou e recomeçou tudo algumas vezes mas não teve jeito de achar o que quer que tenha perdido ali. “Mony Mony” na sequência foi dureza também.

Não sei dizer qual era a causa do problema. Falta de retorno? Embriaguêz? Problemas de memória? Má digestão? Rim? Difícil dizer e não quero saber, na verdade. Preferia que ele tivesse matado a pau no show e aquilo pudesse ter me transportado com mais força de volta aos anos das reuniões dançantes, mas aceito o que recebo. Foi bom ver as caretas de Billy de perto, seus “Yeaaahh!”, seus “Come on!” e a forma como ele meteu pra si mesmo um papo motivacional pra superar os obstáculos no meio do show e depois foi até o fim, afinal. Ah, a banda, de forma geral, estava muito bem e achei as músicas novas, que não conhecia, até bem simpáticas numa primeira ouvida.

Não tenho a mesma relação nostálgica com o Green Day mas é inegável que o show da banda comandada por outro Billie, o Billie Joe Armstrong, foi o melhor da noite e provavelmente um dos melhores do Rock in Rio. Uma rara utilização criativa dos telões no Rock in Rio, com boas animações e efeitos pontuais em cima das imagens captadas no palco. Som forte e nítido. Banda impecável. No que diz respeito ao Billie Joe, performance vocal com tudo em cima e comando do show mais ainda, com interação de sobra com o povo, pedido de casamento no palco e fã subindo pra tocar guitarra lá em cima também. Um dos públicos mais animados, com certeza. Galera cantando junto o tempo todo e em um dado momento se formou até um belíssimo mosh pit só de meninas bem pertinho de mim. Memorável.

Claro que aconteceram mais coisas dignas de nota, mas como já mencionei anteriormente, ainda não desenvolvi nenhum tipo de onipresença e acho que inclusive estou perdendo a pouca capacidade de síntese que tenho. Pode ser a mudança de temperatura. Estou terminando este texto em São Paulo, onde está bem mais friozinho e nada mais lembra o Rock in Rio. Não garanto nada mas se eu achar que ainda tenho informações cruciais para dividir com vocês, voltarei.

Confira as fotos de Rafael Beck logo abaixo!

Green Day no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Green Day no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Green Day no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Billy Idol no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Billy Idol no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Billy Idol no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Billy Idol no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Billy Idol no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Billy Idol no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Fall Out Boy no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Fall Out Boy no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Fall Out Boy no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Fall Out Boy no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Fall Out Boy no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Vitor Kley e Di Ferrero no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Vitor Kley e Di Ferrero no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Vitor Kley e Di Ferrero no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Vitor Kley e Di Ferrero no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Terra Celta no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Marvilla no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Marvilla no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Marvilla no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Jão no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Jão no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Green Day no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Green Day no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Green Day no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Billy Idol no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Billy Idol no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Billy Idol no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Billy Idol no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Billy Idol no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Billy Idol no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Fall Out Boy no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Fall Out Boy no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Fall Out Boy no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Fall Out Boy no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Fall Out Boy no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
1985: a Homenagem no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Vitor Kley e Di Ferrero no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Vitor Kley e Di Ferrero no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Vitor Kley e Di Ferrero no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Vitor Kley e Di Ferrero no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Terra Celta no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Marvilla no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Marvilla no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Marvilla no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Jão no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
Jão no Rock in Rio 2022. Crédito: Rafael Beck
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