Texto por Carolina Kitamura

Na história do heavy metal os estudiosos apontam suas vertentes, denominadas subgêneros, como o glam metal, hair metal, thrash metal, death metal, symphonic metal (particularmente meu favorito). E o que falar do kawaii metal? 

Assim como os demais subgêneros, apresenta suas peculiaridades e contexto: um som rápido, pesado com melodias cativantes e animadas, típicas do j-pop. O termo cunhado pelo produtor Key “Kobametal” Kobayashi, responsável pelo grupo Babymetal, se consolidou em 2014 através da estreia do grupo na famosa plataforma de vídeos, Youtube com seu single viral “Gimme Chocolate!!”. 

Apesar de causar estranheza, o fenômeno consolidado no Brasil é extremamente familiar aos fãs que lotaram a Audio na última segunda-feira, 21. Pode parecer surpresa para o público do Knotfest, mas a verdade é que o trio faz sucesso a anos e tem uma base internacional muito sólida repleta de histórias, encontros com bandas e artistas reconhecidos, colaborações em álbuns, faixas inéditas e performances históricas. Ao atender o pedido incansável dos fãs brasileiros, a produção sabia muito bem o que estava fazendo ao colocá-las no line-up do festival.

No entanto, seria o suficiente para lotar uma casa? É tudo isso mesmo? 

Em seu show solo, o que presenciei foi inédito e incontestável. Uma fila quilométrica podia ser avistada de longe dobrando quarteirões, pronta pra ter o encontro dos sonhos.

Abertura do Seven Hours After Violet

A banda composta pelo baixista Shavo Odadjian, vocalista Taylor Barber, guitarristas Morgoth Beatz e Scarypoolparty, e o baterista Josh Johnson, abriram a casa pro público já agitado por si só apresentando faixas do seu álbum lançado este mês. 

O som pesado foi clássico, perfeito para introduzir uma performance estrondosa das meninas, podendo chamar até mesmo de boost considerando a pancada. O projeto solo de Shavo, do System of a Down, em suas próprias palavras “coisa favorita”, traz de volta suas raízes: linhas melódicas misturadas com um vocal rasgado, guitarras emaranhadas, uma bagunça muito bem organizada. 

A interação com os fãs foi uma troca carinhosa, Shavo agradecia as ovações em português liso: “Obrigado!” seguidos de um claro “Vocês são fodas”. Taylor também se pronunciou: “Amo vocês! Esta é minha primeira vez no Brasil! Vocês são incríveis!”. 

Além das figuras icônicas presentes da banda SHAV, mesmo sem poder avistarmos do local onde estávamos, a galera denunciava a presença de figuras conhecidas: o baixista e baterista do Black Pantera, João Gordo, Lucas Inutilismo. Mais tarde, tomamos conhecimento de que Lucas Silveira, da Fresno, acompanhava sua filha, assim como a filha de Edu Falaschi também curtia o show.

BABYMETAL

Pontualmente às 21h, no telão, a apresentação já conhecida por todos com a clássica frase do Star Wars, “A long time ago in a heavy metal galaxy far, far away…” introduziu o público ao universo do deus raposa. 

A entrada de Su-metal, Momometal e Moametal gerou um surto histérico, o chão tremia, as mãos levantadas ao ar para filmar a entrada das meninas cobria a vista de uma pessoa de 1,59 metros de altura (de acordo com desta com quem vos fala). Uma verdadeira loucura! 

A faixa “Babymetal Death” anunciava o início do fim (dos tempos mesmo, parecia um estrondo) onde cada uma se introduziu ao som ritualístico. Agora um plus curioso sobre essa faixa em específico: “o nome seguido da palavra “death” também pode ser ouvido como o onorífico desu (partícula que adiciona formalidade à sentença” – acrescenta a tradutora Marjory Rebelo.

Tal trocadilho é comum e visto em outras mídias como no anime Senki Zesshou Symphogear pela personagem Kirika Akatsuki, representando o sub gênero symphonic metal, onde a todo momento acrescenta death no final das frases como afirmativo, além de portar o número 4 como seu símbolo, que também pode ser lido como Shi (Death).

Logo, Pa Pa Ya tirou a pista do chão e a impressão que ficava era que a Audio ia decolar a qualquer momento, e não era nem a segunda música! Eram inúmeras as pessoas tirando suas camisetas e girando-as no ar. Isso e um jogo do Corinthians não tinha diferença alguma, pessoas vestindo vermelho, preto e branco alucinadas pelo seu ídolo em “campo”. 

Em outro momento, ao apresentarem “METALI!!” – sua primeira música lançada com a nova formação e com participação inédita de Tom Morello – a galera arrancou um sorriso sincero de Su-metal e Moametal ao acompanharem o pré refrão da música anunciado pela Momometal. Foi um grito estrondoso, potente, uníssono, lindo de se ver. 

Monochrome também marcou a noite com um mar de luzes a pedido de Su. Se tratando de uma faixa mais melódica, sentimental, foi possível apreciar o doce vocal da líder em meio aos adlibs arrepiantes.

Um fenômeno

Sem explicações, a mídia se espantou com a grandiosidade desse grupo. Como elas lotaram uma casa? Onde estavam esses fãs? Porque fazem tanto sucesso? 

As respostas são mais simples do que parece. O conceito do grupo promete uma experiência completa, sem pender para nenhum lado, deixando de lado os rótulos e se apegando ao universo criado.

“This ain’t heavy metal, welcome to the world of BABYMETAL” – trecho da faixa “FUTURE METAL” de seu álbum GALAXY METAL.

A música japonesa sempre foi vista como o outro, sem esforço a mídia ocidental apresenta tudo como música de anime ou j-pop. Isso é fruto da falta de familiaridade e não vou culpar ninguém disso. 

Existe uma comunidade extremamente ativa no Brasil dedicada ao mercado musical japonês. Seus artistas estão sempre denunciando a falta de expressão do indivíduo e a normatividade. Os códigos de vestimenta, formalidade, escalas de trabalho e padrões são exaustivos e a juventude reage contra. (Ei, a gente vê algo parecido em outros países, não?)

Compartilhando o sentimento de rebeldia ou do ser “diferente” (o que de longe é uma ofensa) em comum, o jovem brasileiro acha conforto na diversidade dos artistas japoneses, mesmo conforto que consola diferentes japoneses que buscam fugir de uma rotina puxada cheia de regras ou da cultura de massa. O assunto é longo e não quero me prolongar aqui, ressalto que não quero enaltecer os aspectos ruins da cultura.  

Isso torna seu conteúdo infantil? Não! Pelo contrário, pode proporcionar desde músicas com letras profundas e delicadas com assuntos pesados até mesmo a simplicidade de um refrão como por exemplo “Gimme Chocolate!!” no intuito de divertir e se aliviar da tensão e estresse em exaltação sem se preocupar com sua identidade. 

Babymetal é pro pai, mãe, CEO, titia, vovó, estudante colegial, universitário, criança, trabalhador. Não é só para baixinhos! Nós precisamos de uma música para extravasar de vez em quando, quem nunca botou um metal pesadão no fone dentro do metrô de São Paulo em horário de pico? 

E agora que os fãs brasileiros provaram sua força, esperamos que o país receba mais atenção trazendo-as para uma casa maior, com mais datas, até porque muito fã ficou de fora dessa noite inesquecível.

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