Texto por Clovis Roman
O formato acústico sempre esteve presente nos shows do Angra, desde os primórdios. Muitas ações promocionais em lojas e aparições na televisão se utilizavam desse formato, e alguns lançamentos pontuais traziam músicas despidas de distorção.
Basta citar as faixas ao vivo na FNAC francesa, que saíram como bônus no EP Freedom Call, ou as presentes no EP Hunters and Prey. Eu mesmo vi duas apresentações focadas no violão e voz, nas épocas dos lançamentos do Rebirth e Temple of Shadows.
Por demanda popular, a banda preparou um show completo que, além dos integrantes fixos da formação, trouxe pianista, percussionista e uma orquestra de câmara – além dos convidados especiais em determinadas canções.
O primeiro show assim foi realizado em Curitiba, em 2023, e gravado para o iminente lançamento ao vivo da banda em formatos áudio e vídeo. Neste ano, datas selecionadas foram agendadas, e pela primeira vez, portanto, o show acústico do Angra chegou a São Paulo no último dia 17, no Espaço Unimed. A configuração com pista e mesas ao fundo permitiu aos fãs escolherem como gostariam de presenciar o espetáculo: de pé ou sentados.
Sem banda de abertura, pouco após às 22 horas, os integrantes a banda e os músicos de apoio sobem ao palco e atacam, logo de cara, com “Nova Era”, mais cadenciada e sem pedais duplos. Abrir com um clássico desses foi uma tacada certeira, assim como o foi segui-la com “Make Believe”, com Fabio Lione transitando do mas agressivo ao delicado (assim como em várias outras no decorre do setlist).
Belíssima, “Storm of Emotions” despertou sensações diversas, estas, dilatadas com “Gentle Change”, pérola do álbum Fireworks que voltou a ser presença constante nos shows da banda, mesmo nos elétricos. Diferente do que está registrado em Omni (2018), Lione assume os vocais em “The Bottom of my Soul”, cuja voz original no CD é de Rafael Bittencourt – que brilhou em momento solo com a icônica “Reaching Horizons”.
Logo após, apresenta os músicos no ritmo daquela famosa canção do programa Sílvio Santos, como uma homenagem ao apresentador recém falecido. Este momento abriu as portas para os convidados especiais.
O talento e carisma de Vanessa Moreno já são conhecidos dos fãs, pois ela gravou “Here in the Now” no mais recente disco, Cycles of Pain, e esteve no show acústico de Curitiba no ano passado. Todavia, mesmo assim, o que a cantora apresentou aqui foi motivo de espanto (uma reação que, no Rio de Janeiro, no dia seguinte, foi ainda mais efusiva). Na própria “Here in the Now”, ela e Lione brilharam, em uma performance no qual a voz de Vanessa foi a guia.
Em “Wuthering Heights”, sozinha, Vanessa entregou tudo e mais um pouco, mostrando versatilidade vocal e uma entrega espiritual e física sem precedentes.
O dueto retorna ao foco na pomposa e emocional “Tears of Blood”, gravada em estúdio por Amanda Somerville. Outro convidado de honra seria o ex-integrante do próprio Angra (e também Megadeth) Kiko Loureiro, que surge em “No Pain for the Dead” para um reencontro histórico; outra cantada junto a Vanessa.
Em “Holy Land”, Bittencourt e Loureiro escancaram uma sintonia descomunal, com direito a solo estendido no final, e em “Late Redemption”, Kiko cantou as partes em português. Todos se reúnem novamente em “Rebirth”, cantada por banda e plateia. Público que, inclusive, foi um tanto ameno em diversos momentos, seja pela displicência ou por estarem tão envoltos no show que deixaram as reações mais ruidosas de lado.
Os arranjos da bateria de Bruno Valverde se mostraram excelentes, com reminiscências mais óbvias do jazz, que permeia sua formação musical. No contrabaixo, Felipe Andreoli imprimiu uma consistência sonora impenetrável. Nas seis cordas, Marcelo Barbosa foi o elo de ligação ao lado de Bittencourt. Adicionado a isto, Lione com seu vocal potente e de sonoridade ampla. O termo sintonia descomunal me volta a mente, não tem como.
A hoje universal “Bleeding Heart” e o clássico supremo “Carry On” enceraram uma performance desprovida de peso e distorção em proporção inversa à beleza dos novos arranjos, ao resplandecer das harmonias e melodias, que tomaram a dianteira nesse formato.
O Angra oferece muitos aos seus fãs, desde sempre. Os repertórios sempre contam com mudanças significativas, turnês de álbuns se entrelaçam em outras comemorativas e esta, acústica, é mais um presente do grupo aos seus seguidores. Que venha o próximo passo.
Confira fotos exclusivas, por Clóvis Roman, em nossa galeria.
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