O peso aumentou. As bandas mudaram. Mas de Beatles à Cannibal Corpse, o espírito sempre foi o mesmo.”

 

A LIBERDADE QUE VEM DO ROCK

Por Daniel Dystyler

No final de 2010, a Apple fez uma das melhores coisas que poderia ter feito na vida, a qual serei eternamente grato:

Como parte das comemorações do lançamento do catálogo completo dos Beatles na iTunes Store, eles disponibilizaram por um período relativamente curto, o primeiro show dos Beatles nos EUA. Em vídeo. Na íntegra. Sem nenhum corte entre as músicas.

Aqui cabe uma observação:
Fanático por Beatles que sou, eu já vi inúmeros vídeos, clipes, documentários, Anthology, First US Visit, etc. Mas nunca tinha visto um show inteiro. Sem cortes. Como se estivesse sendo transmitido ao vivo.

E foi mágico. Poder ver como eles se comportavam entre as músicas. O que eles falavam com o público. O que eles faziam e como agiam. Como eles entraram no palco e como saíram.

Foi uma experiência incrível. E muito reveladora por sinal, afinal 3 coisas que eu nem imaginava me chamaram muito a atenção.

A primeira:
O Paul era, de longe (mas muito longe) o absoluto dono da banda. Praticamente só ele falava com o público. Cantava a enorme maioria das músicas. Enfim, era o dono e líder da banda. Lennon, era tímido. Quieto. No canto. Totalmente diferente do que eu imaginava (Parte 1).

Paul e John em 1964 no primeiro show nos EUA, em Washington. Prestes a dominar o país e o Mundo.

Vale ressaltar que esse show foi em Washington em 1964, se não me falha a memória (apenas dias após a famosa aparição no ‘Ed Sullivan Show’ que assolou o país), ou seja, a banda não estava “iniciando”, mas o papel de destaque de John só veio depois disso.

A segunda:
Ringo era uma espécie de “Dave Lombardo da época”. A bateria tremia e ele agitava muito durante o show. Totalmente diferente do que eu imaginava (Parte 2).

E por fim, a terceira coisa, que é o motivo deste texto:
A transgressão. A quebra de todas as regras pré-estabelecidas. A rebeldia. Da banda e do público. Aqueles jovens, sentados em suas cadeiras estavam fazendo a maior ruptura das normas da época. Era um comportamento de trangressão pura. De romper com tudo.

E era libertador.
E é disso que eu quero falar neste texto.

Antes, coloquemos as coisas na perspectiva de hoje em dia:
Quatro meninos. Vestidos de terno e gravata. Cantando “I Want To Hold Your Hand” ou “Can’t Buy Me Love”. O que isso pode ter, mesmo que remotamente, algo a ver com rebeldia, transgressão e quebra de regras ?????

Na perspectiva de hoje, nada.
Mas em 1964, tudo.

E é essa a 3a. coisa que me chamou a atenção no vídeo: A sensação de liberdade completa que aqueles jovens tinham ao gostar daquela banda e agitar naquele show. A oposição absoluta ao que sociedade, governo, família, igreja, enfim, instituições, pregavam e ditavam como norma.

Era o espírito do Rock em seu estado mais natural e puro possível.

Pouca gente sabe, mas Ringo agitava muito nos shows.

Pois bem, aqueles jovens cresceram, casaram, tiveram filhos, contas pra pagar, e uma nova geração veio. Que precisava também respirar esses ares de rebeldia. De transgressão. De antagonismo ao pré-estabelecido.

E se o Heavy Metal não foi o único caminho encontrado, seguramente foi um dos mais importantes. E o que aconteceu desde os tempos de Sabbath, Purple e Zeppelin até os anos 80 com Maiden, Priest, Metallica e muitos outros, era exatamente isso: Uma das novas formas de transgredir. Gostar de Heavy Metal, curtir esse tipo de som, vestir-se de preto, deixar o cabelo crescer era romper com o status quo e viver à margem do que a sociedade definia como normal ou aceitável.

E por isso, músicas como “The Number Of The Beast” do Iron Maiden ou “Black Magic” do Slayer ou “The Four Horsemen” do Metallica (entre milhões de exemplos) são tão importantes. São símbolos vivos da transgressão da época. Era a forma de fazer com que a juventude abraçasse aquilo que a Sociedade condenava e tinha medo. Era uma das formas de se rebelar com atitude Rock ‘n Roll.

E se nos anos 80, ouvir Iron Maiden, Metallica ou Slayer era sinônimo de transgressão, hoje em dia, embora ainda longe de ser mainstream, não é mais. Ninguém mais é visto com outros olhos porque gosta de AC/DC, Whitesnake, Ozzy ou Scorpions. Mas no primeiro Rock In Rio, quando essas bandas vieram, sim. Éramos transgressores. Agora não mais. Agora toca ‘Crazy Train’ até em desenho da Pixar ou no intervalo do jogo da NBA.

Nos anos 80, as capas do Iron Maiden chocavam e eram sinônimos de rebeldia e transgressão. Atualmente, bandas como Cannibal Corpse cumprem muito bem essa função.

Então uma nova onda de bandas que despertassem o espírito de rebeldia se fez necessária. Era preciso a criação de novos estilos que conseguiriam novamente romper com o que já havia sido aceito pela Sociedade.

Esse processo começou lá atrás com o Thrash Metal e outros movimentos como o Death, Black, etc, passou pela mão do Pantera nos anos 90 e hoje temos vários representantes, de várias vertentes, que cumprem esse papel.

São bandas cuja experiência de ouvir o álbum ou ir ao show faz com que os jovens de hoje, consigam novamente se sentir livres, respeitados e sem a opressão que vem de todos os lados.

Essas bandas diferem enormemente entre si (tanto no estilo musical como na filosofia, postura e temática), mas elas têm em comum esse objetivo de ajudar a recriar o espírito de liberdade e transgressão. De chocar e chacoalhar a sociedade. De Krisiun a Cannibal Corpse. De Lamb of God a My Dying Bride. De In Flames a Paradise Lost. De Dark Tranquility a Six Feet Under.

Krisiun, representando muito bem a geração de bandas que mantém o legado extremo vivo. E é um Orgulho Nacional !!!

Torço para que pelos anos que estão por vir, a Liberdade que vem do Rock e do Metal consiga sempre encontrar o caminho para os corações e as mentes de todos aqueles que amam o estilo e lutam por mantê-lo vivo.

É um legado que nasceu com os Beatles e que permanece mais vivo do que nunca. Afinal, não é à toa que quase 30 anos depois do primeiro Rock In Rio, ao fazer o anúncio do Festival em 2013 ainda temos como grandes destaques do evento as bandas do estilo que amamos: Iron Maiden, Metallica, Slayer, Ghost, Alice In Chains, etc.

Ainda bem.

Para terminar fechando o ciclo:
Se ‘Helter Skelter’ não é suficiente para você ter a mais absoluta certeza que os Beatles ajudaram e influenciaram o movimento Heavy Metal que estava se formando na época (mesmo que seja apenas para sinalizar para ‘Ozzy & Cia’, ‘Gillan & Cia’ e ‘Plant & Cia’ que esse era um ótimo caminho a ser seguido), por favor ouça a música ‘I Want You’ (que está no sensacional ‘Abbey Road’).

É impossível não relacionar essa música com o Black Sabbath. Na base dos últimos 3 minutos da música dá até pra visualizar o Ozzy no meio do palco gritando “Let’s get fuckin’ crazy !!!!”

É isso. O peso aumentou. As bandas mudaram. Mas de Beatles à Cannibal Corpse, o espírito sempre foi o mesmo.

Parabéns se você também é um “rebelde” até hoje.

Clique aqui para ver os outros textos escritos por Daniel Dystyler

Ouça as novidades e dicas de Daniel Dystyler:

Categorias: Opinião

Apaixonado por música, em particular por rock e heavy metal, co-fundou o Wikimetal em 2011. Foi roadie do VIPER desde a fundação da banda até o final da tour do álbum 'Theatre of Fate'. Sempre teve o desejo de ajudar a difundir o heavy metal que foi alvo de tanto preconceito ao longo dos anos. O Wikimetal é uma forma de defender, propagar e perpetuar o metal no Brasil.