Allianz Parque ficou lotado para se despedir de Ozzy Osbourne
Reinvenção. Essa é a palavra que não saiu da minha cabeça durante todo o show de Ozzy Osbourne no Allianz Parque na noite de 13 de maio.
Pela 5a. vez seguida eu tive oportunidade de ver o Príncipe das Trevas ao vivo (sem contar as 2 recentes passagens com o Black Sabbath nos shows do 13 e The End) dentre as 6 vezes que ele veio ao país com sua banda solo.
Infelizmente, como eu tinha 15 anos na época, não pude ir ao primeiro show de Ozzy no Brasil no histórico Rock In Rio de 1985, mas desde seu retorno em 1995, estive em todos os shows do Madman.
Reinvenção. A palavra não desgrudou durante todo o show. Era mais uma torcida do que um pressentimento. Eu queria uma reinvenção.
Mas se essa reinvenção fosse acontecer, não seria no setlist.
Afinal, dentre todas as músicas apresentadas naquele distante primeiro show que eu vi em 1995 no Pacaembu, de diferente hoje apenas “Road To Nowhere” que entrou no lugar de “Goodbye To Romance” e “Shot In The Dark” substituindo “I Just Want You” (além do medley instrumental e de pequenas mudanças nos tradicionais covers do Sabbath que Ozzy sempre apresenta). O resto do set foi exatamente igual ao de 23 anos atrás.
Mas eu fui para o Allianz torcendo muito para que Ozzy nos surpreendesse com algo. Se a reinvenção de Ozzy não viria do setlist, quem sabe ele não inventaria alguma coisa, aliás como ele vem fazendo nos últimos 50 anos, afinal a história do Príncipe das Trevas é uma reinvenção atrás da outra:
Ozzy se reinventou ao criar uma brilhante carreira solo recheada de sucessos após ter sido expulso do Black Sabbath.
Ozzy se reinventou ao apresentar ao mundo, guitarristas geniais como Jake E. Lee e Zakk Wylde após ter perdido prematuramente o imortal Randy Rhoads.
Ozzy se reinventou ao voltar da suposta aposentadoria várias vezes: A tour do 1o. show que vi em 1995 chamava-se Retirement Sucks (“Aposentadoria é um saco”, em tradução livre), que sucedia a suposta No More Tours 1.
Ozzy se reinventou ao abrir a intimidade de sua família no seriado “The Osbournes” da MTV e fazer um papel que não condizia com a relevância que John Michael Osbourne tem, e para sempre terá, na História da Música.
Ozzy se reinventou ao voltar a fazer tours eletrizantes depois dessa fase do reality show que mostrava uma caricatura do Príncipe das Trevas.
Ozzy se reinventou ao escrever a auto-biografia mais engraçada já feita que começa com a frase “Eles disseram que eu nunca escreveria este livro”.
Ozzy se reinventou em seu casamento com Sharon que passeou por inúmeros desafios, desde tentativa de assassinato até affairs descobertos.
Recentemente o Madman lançou um podcast “The Osbournes” além do seriado sobre pontos turísticos históricos com seu filho Jack.
E assim, as reinvenções de Ozzy Osbourne foram se sucedendo e não pararam. Quem sabe ele guardou alguma pra hoje em São Paulo?
Quando o épico “O Fortuna”, trecho de “Carmina Burana” ecoou no ex-Parque Antárctica, os 40 mil presentes sabiam que o Príncipe das Trevas havia chegado, uma vez que o tema tradicionalmente abre os shows de Ozzy Osbourne.
O eletrizante riff de “Bark at the Moon” anunciou o início do show e desde a primeira nota até a despedida com “Paranoid” pudemos constatar novamente a presença e influência quase que messiânica que Ozzy tem com seu público.
Chegando aos 70 anos, Ozzy Osbourne não deixou de esbanjar carisma e simpatia dando a nítida sensação que ele curte cada segundo do seu show, tanto quanto o público. Bem diferente por sinal, de outros artistas, inclusive mais jovens, que aparentam estar lá para cumprir uma obrigação.
E aí tivemos várias coisas tradicionais que não são reinvenções, mas que todo mundo quer ver nos shows de Ozzy:
O uivo no final de “Bark at the Moon” com Ozzy pedindo pra todos uivarem junto com ele;
A demora proposital pra começar a cantar o começo de “Mr. Crowley”, logo após a introdução de teclado criada pelo genial Don Airey, hoje no Deep Purple, e executada magistralmente por Adam Wakeman, filho de Alan;
Os gritos de “Hey” de Ozzy, no solo de “Mr. Crowley”, a segunda música do show. Solo este, criado pelo genial Randy Rhoads e executado magistralmente por Zakk Wylde;
Os pulos, as palmas, os “I can’t fucking hear you” e “Let’s get crazy”, as ajoelhadas;
E assim fomos indo ao longo do show. Sem reinvenções, mas com itens indispensáveis em um show de Ozzy.
“I Don’t Know” veio na sequência com um Zakk insandecido, tocando o riff de abertura de forma matadora, de frente para o baterista Tommy Clufetos.
A música foi sucedida pelo primeiro cover de Black Sabbath da noite, o clássico “Fairies Wear Boots” que contou com o tecladista Adam Wakeman tocando guitarra, permitindo que Zakk possa improvisar e colocar uma pegada mais “Black Label Society” no riff principal, iluminados por um telão colorido e psicodélico em referência à letra da música.
“Suicide Solution” teve possivelmente o melhor solo de Zakk Wylde da noite e as imagens no telão traziam um efeito em branco e preto que davam um visual incrível contrastando com a cruz no centro do telão principal que projetava texturas, formas e cores.
Na sequência, e completando a banda, tivemos o baixista Blasko fazendo o famoso riff de abertura da lendária “No More Tears”.
Na recente entrevista que Ozzy deu ao Fantástico, ele disse que “não se considera um grande vocalista, mas que é um verdadeiro Maestro da Loucura”. Pois foi em “No More Tears” que isso ficou mais claro: Um Ozzy teatral toma conta do palco que com um olhar louco e transtornado encara fixamente o público. Ozzy corre de um lado para o outro, pede palmas, rege o estádio e no final do solo, beija a cabeça de Zakk Wylde agarrando-o pelo pescoço com as 2 mãos, enquanto o guitarrista completava o solo.
“Road To Nowhere” é uma música que definitivamente funciona melhor em estúdio do que ao vivo, dando uma esfriada no público apenas para que minutos depois as luzes vermelhas acompanhadas da tradicional sirene anuncie o 2o. cover de Black Sabbath. O estádio vem abaixo em “War Pigs”.
Novamente Adam Wakeman assume a guitarra base na música que transforma o estádio em uma enorme torcida de futebol quando vem o “Ôôôôô” do final.
O final da música emenda com o solo de Zakk com direito a guitarra nas costas, solo com a boca e outras acrobacias que foram emendadas em um medley instrumental de “Miracle Man”, “Crazy Babies”, “Desire” e “Perry Mason” que Zakk tocou descendo do palco e encostado na grade.
O fim do medley foi a deixa para o solo de bateria de Tommy Clufetos que embora tenha agradado, é inevitável não lembrar de outro Tommy, o Aldridge, conduzindo os tambores de Ozzy no Rock In Rio, quando em seu solo deixou sangue nas peles da bateria de tanto bater com as mãos.
É evidente a necessidade desse interlúdio com solo de Zakk, medley instrumental e solo de Clufetos para que Ozzy possa descansar e dar uma recuperada. Mas é inegável que essa passagem dá uma esfriada no show e as próximas músicas não contaram com a mesma pegada e empolgação, nem da banda, nem do público.
“Flying High Again”, a única música do perfeito Diary of a Madman tocada nesta noite, começou com a guitarra quase inaudível, um refrão que não engrenou e no solo foi o maior momento que deu pra sentir a falta de Randy Rhoads.
“Shot In The Dark” e “I Don’t Want to Change the World” com levadas tranquilas sem a pegada da primeira parte, também não conseguiu devolver a empolgação ao público que só foi retomada quando Ozzy anunciou a próxima música pedindo pra todos “ficarem loucos” na famosa “Crazy Train” que encerrou o show.
Após uma curta pausa, Ozzy e banda voltaram para uma linda execução de “Mama, I’m Coming Home” que além dos tradicionais celulares iluminando o estádio, contou com luzes coloridas tomando conta do Allianz Parque inteiro, criando um visual incrível.
Como é tradição, Ozzy se despediu com o terceiro e último cover de Black Sabbath, “Paranoid”.
A minha torcida por algo inédito e surpreendente que mostrasse Ozzy se reinventando de novo, não se concretizou.
Talvez a “No More Tours 2” de fato marque o fim das tours mundiais de Ozzy Osbourne. Ou talvez a intenção seja de nos deixar na dúvida e sempre torcendo por uma nova loucura do Príncipe das Trevas, por uma nova reinvenção.
O fato é que com carisma e simpatia, Ozzy se despediu para sempre de São Paulo.
Para sempre, até a próxima reinvenção.
Confira o setlist de hoje:
- Bark at the Moon
- Mr. Crowley
- I Don’t Know
- Fairies Wear Boots (Cover de Black Sabbath)
- Suicide Solution
- No More Tears
- Road to Nowhere
- War Pigs (Cover de Black Sabbath)
- Miracle Man / Crazy Babies / Desire / Perry Mason (Solo de Zakk Wylde)
- Solo de Bateria
- Flying High Again
- Shot in the Dark
- I Don’t Want to Change the World
- Crazy Train
- Mama, I’m Coming Home
- Paranoid (Cover de Black Sabbath)